sábado, 26 de novembro de 2016


Preço dos carros mais vendidos do Brasil sem impostos


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CHEVROLET ONIX

No início do ano o agora ex-presidente da Anfavea (associação dos fabricantes de veículos), Luiz Moan, disse que a carga tributária sobre os automóveis no Brasil é 54,8% do preço final. Diante disso, calculamos o preço dos carros mais vendidos até setembro no País sem os impostos, usando o preço das versões de entrada. O Chevrolet Onix 1.0 que custa R$ 44.890 sairia por R$ 20.290 Foto:
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HYUNDAI HB20

O Hyundai HB20 que parte de R$ 41.655 custaria R$ 18.828 Foto
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FORD KA

A versão de entrada do Ford Ka, o terceiro mais vendido, sai por R$ 42.590 e custaria R$ 19.250 
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FIAT PALIO

A versão de entrada do Palio está à venda por R$ 30.040, mas sem os impostos sairia por R$ 13.578
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TOYOTA COROLLA

O sedã médio mais vendido do País parte de R$ 68.740, mas sem os encargos custaria R$ 31.070
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CHEVROLET PRISMA

Com preço inicial de R$ 53.990, o Prisma custaria R$ 24.403 sem os impostos
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FIAT STRADA

A picape mais vendida do País inicia em R$ 46.790 e sairia por R$ 21.149
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HONDA HR-V

Apesar de não ser a mais vendida, a versão de entrada do HR-V custa R$ 79.900 e sem os impostos sairia a R$ 36.114 
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RENAULT SANDERO

Com o motor 1.0, o Sandero começa em R$ 41.100, valor que cairia para R$ 18.577
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VOLKSWAGEN GOL

Depois que recebeu o motor 1.0 três cilindros, o Gol parte de R$ 35.150 e custaria R$ 15.887
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JEEP RENEGADE

Com preço inicial de R$ 71.990, o Jeep Renegade com motor flexível partiria de R$ 32.539
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VOLKSWAGEN FOX

O Volkswagen Fox parte de R$ 45.270, mas poderia iniciar em R$ 20.462 sem os impostos 
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HYUNDAI HB20 S

A versão de entrada do HB20 S custa R$ 48.855, valor que cairia para R$ 22.082 sem os impostos
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VOLKSWAGEN SAVEIRO

A rival da Strada foi recentemente renovada e parte de R$ 44.490 na versão para o trabalho, que custaria R$ 20.109
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VOLKSWAGEN UP!

Com preço inicial de R$ 34.430, o compacto Up! poderia partir de R$ 15.562 sem os impostos 
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TOYOTA ETIOS

O Etios hatch que custa R$ 45.320 passaria a custar R$ 20.484 sem os impostos
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FIAT TORO

Com preço inicial de R$ 82.930, a picape Toro poderia custar R$ 37.484 
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FIAT GRAND SIENA

Com o fim do Siena EL, a versão de entrada da linha é o Grand Siena com preço de R$ 50.750 que custaria R$ 22.939
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FIAT UNO
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TOYOTA HILUX

A picape média Hilux tem preço inicial de R$ 119.900 e sairia por R$ 54.194 



quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Parábolas e Ensinos de Jesus...



AS PARÁBOLAS E A SUA INTERPRETAÇÃO

 Na acepção geral do termo, parábola é uma narrativa que tem por fim transmitir verdades indispensáveis de serem compreendidas. As Parábolas dos Evangelhos são alegorias que contêm preceitos de moral. O emprego contínuo, que durante o seu ministério Jesus fez das parábolas, tinha por fim esclarecer melhor seus ensinos, mediante comparações do que pretendia dizer com o que ocorre na vida comum e com os interesses terrenos. Sugeria, assim, o Mestre, figuras e quadros das ocorrências cotidianas, para facilitar mais aos seus discípulos, por esse método comparativo, a compreensão das coisas espirituais. Aos que o ouviam ansiosamente, procurando compreender seus discursos, a parábola tornava-se-lhes excelente meio elucidativo dos temas e das dissertações do Grande Pregador. Mas os que não buscavam na parábola a figura que compara, a alegoria que representa a idéia espiritual, e se prendiam à forma, desprezando o fundo, para estes a Doutrina nem sequer aparecia, mas conservava-se oculta, como a noz dentro da casca. Daí a resposta de Jesus aos discípulos que lhe inquiriram a razão de Ele falar por parábolas: “Porque a vós é dado conhecer os mistérios do Reino dos Céus, mas a eles não lhes é isso dado. Pois ao que tem, dar-selhe-á e terá em abundância; mas ao que não tem; até aquilo que tem serlhe-á tirado.” “Por isso lhes falo por parábolas, porque vendo não vêem; e ouvindo não ouvem, nem entendem. E neles se está cumprindo a profecia de Isaías, que diz: Certamente ouvireis, e de nenhum modo entendereis. Porque o 19 coração deste povo se fez pesado, e os seus ouvidos se fizeram tardos, e eles fecharam os olhos; para não suceder que vendo com os olhos e ouvindo com os ouvidos, entendam no coração e se convertam e eu os cure.” Pelo trecho se observa claramente que os fariseus e a maioria dos judeus, em ouvindo a exposição da parábola, só viam a figura alegórica que lhes era mostrada, assim como, quem não quebra a noz, só lhe vê a casca. Ao passo que com seus discípulos não acontecia à mesma coisa; eles viam e ouviam o ensino, o sentido espiritual que permanece para sempre; não se prendiam à figura ou a palavra sonora, que se extingue desvanece. De modo que os fariseus ouviam, mas não ouviam; viam, mas não viam (*); porque uma coisa é ver e ouvir com os olhos e ouvidos do corpo, outra coisa é ver e ouvir com os olhos e ouvidos do Espírito. (*) Em outros termos: ouviam, mas não escutavam; viam, mas não enxergavam. A condição que Jesus expõe, como sendo indispensável “para nos ser dado e possuirmos em abundância” é como diz o texto, de “nós termos” — Mas “termos” o quê? Certamente algum princípio doutrinário unido à boa vontade para recebermos a Verdade — “Aquele que tem ser-lhe-á dado e terá em abundância.” E o obstáculo à recepção da sua Doutrina é o indivíduo “não ter” — não ter a mais ligeira iniciação espiritual e não ter boa vontade para receber a Nova da Salvação. De modo que a Parábola Evangélica é uma instrução alegórica, exposta sempre com um fim moral, como um meio fácil de fazer compreender uma lição espiritual, pelo menos, a opinião do evangelista Mateus quando diz: “Todas estas coisas falou Jesus ao povo em parábolas, e nada lhes falava sem parábolas; para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta: Abrirei em Parábolas a minha boca, e publicarei coisas escondidas desde a criação.” (Mateus, XIII, 34-35). 20 Finalmente, as Parábolas têm pouca importância para os que as tomam como foram escritas; demais, o sentido nunca deve ser desnaturado ou transviado, sob pena de prejudicar a Idéia Cristã. Por exemplo, ao que vê na parábola do “tesouro escondido” um meio de enriquecer materialmente, ou na parábola do “administrador infiel” uma lição de infidelidade, lhe será preferível fechar os Evangelhos e continuar a tratar de seus negócios materiais. A inteligência dos Evangelhos explica perfeitamente a interpretação espiritual que Jesus dá aos seus ensinos. Se os Evangelhos fossem um amontoado de alegorias sem significação espiritual, nenhum valor teriam. 21 

PARÁBOLA DO SEMEADOR
 Afluindo uma grande multidão e vindo ter com Ele gente de todas as cidades, disse Jesus em parábola: “Saiu o Semeador para semear a sua semente. E quando semeava, uma parte da semente caiu à beira do caminho; foi pisada, e as aves do Céu a comeram. Outra caiu sobre a pedra; e tendo crescido, secou, porque não havia umidade. Outra caiu no meio dos espinhos; e com ela cresceram os espinhos, e sufocaram-na. E a outra caiu na boa terra, e, tendo crescido, deu fruto a cento por um. Dizendo isto clamou: Quem tem ouvidos para ouvir, ouça. Os seus discípulos perguntaram-lhe o que significava esta parábola. Respondeu-lhes Jesus: A vós vos é dado conhecer os mistérios do Reino de Deus, mas aos outros se lhes fala em parábolas, para que vendo não vejam; e ouvindo não entendam:” O sentido da parábola é este: “A semente é a Palavra de Deus. Os que estão à beira do caminho são os que têm ouvido; então vem o Diabo e tira a Palavra dos seus corações, para que não suceda que, crendo, sejam salvos. Os que estão sobre a pedra são os que, depois de ouvirem, recebem a Palavra com gozo; estes não têm raiz e crêem por algum tempo, mas na hora da provação voltam atrás. A parte que caiu entre os espinhos, estes são os que ouviram, e, indo seu caminho, são sufocados pelos cuidados, riquezas e deleites da vida e o seu fruto não amadurece. E a que caiu na boa terra, estes são os que, tendo ouvido a palavra com coração reto e bom, a retêm e dão frutos com perseverança.” (Mateus, XIII, 1-9 - Marcos, IV, 1-9 - Lucas, VIII, 4-15.) A Parábola do Semeador é a parábola das parábolas: sintetiza os caracteres predominantes em todas as almas, ao mesmo tempo que nos 22 ensina a distingui-las pela boa ou má vontade com que recebem as novas espirituais. Pelo enredo do discurso vemos aqueles que, em face a Palavra de Deus, são “beiras de caminho” onde passam todas as idéias grandiosas como gentes nas estradas, sem gravarem nenhuma delas; são “pedras” impenetráveis às novas idéias, aos conhecimentos liberais; são “espinhos” que sufocam o crescimento de todas as verdades, como essas plantas espinhosas que estiolam e matam os vegetais que tentam crescer, nas suas proximidades. Mas se assim acontece para o comum dos homens, como para a grande parte de terra improdutiva, que faz arte do nosso mundo, também se distingue, dentre todos, uma plêiade de espíritos de boa vontade, que ouvem a Palavra de Deus, põem-na por obra, e, dessa semente bendita resulta tão grande produção que se pode contar a cento por uma”. De maneira que a “semente” é a palavra de Deus, Lei do Amor que abrange a Religião e a Ciência, a Filosofia e a Moral, inclusive os “Profetas” e se resume no ditame cristão: “Adora a Deus e faze o bem até aos teus próprios inimigos.” A Palavra de Deus, a “semente”, é uma só, quer dizer, é sempre a mesma que tem sido apregoada em toda arte, desde que o homem se achou em condições de recebê-la. E se ela não atua com a mesma eficácia em todos, deriva esse fato da variedade e da desigualdade de espíritos que existem na Terra; uns mais adiantados, outros mais atrasados; uns propensos ao bem, à caridade, à liberalidade, à fraternidade; outros propensos ao mal, ao egoísmo, ao orgulho, apegados aos bens terrenos, às diversões passageiras. A terra que recebe as sementes, representa o estado intelectual e moral de cada um: “beira do caminho, pedregal, espinhal e terra boa”. Acresce ainda que nem todos os pregoeiros da Palavra a apregoam tal como ela é, em sua simplicidade e despida de formas enganosas. Uns revestem-na de tantos mistérios, de tantos dogmas, de tanta retórica; 23 ornam-na com tantas flores que, embora a “palavra permaneça”, fica obscurecida, enclausurada na forma, sem que se lhe possa ver o fundo, o âmago, a essência! Muitos a pregam por interesse, como o “mercenário que semeia”; outros por vangloria, e, grande parte, por egoísmo. Nestes casos não dissipam as trevas, mas aumentam-nas; não abrandam corações, mas endurece-os; não anunciam a Palavra, mas dela fazem um instrumento para receber ouro ou glórias. Para pregar e ouvir a Palavra, é preciso que não a rebaixemos, mas a coloquemos acima de nós mesmos; porque aquele que despreza a Palavra, anunciando-a ou ouvindo-a, despreza o seu Instituidor, e, como disse Ele: “Quem me despreza e não recebe as minhas palavras, tem quem o julgue; a Palavra que falei, esta o julgará no último dia: Sermo, quem locutus sum, ille judicabit eum in novíssimo dia.” (João, XII, 48.) Que belíssimo quadro apresenta-se às nossas vistas, quando, animados pelo sentimento do bem e da nossa própria instrução espiritual, lemos, com atenção, a Parábola do Semeador! A nossa frente desdobra-se vasto campo, onde aparece a extraordinária Figura do Excelso Semeador, o maior exemplificador do amor de todas as idades, e aquele monumental Sermão ressoa aos nossos ouvidos, convidando-nos à prática das virtudes ativas, para o gozo das bem-aventuranças eternas! O Espiritismo, filosofia, ciência, religião, independente de todo e qualquer sectarismo, é a doutrina que melhor nos põe a par de todos esses ditames, porque, ao lado dos salutares ensinos, faz realçar a sobrevivência humana, base inamovível da crença real que aperfeiçoa, corrige e felicita! Que os seus adeptos, compenetrados dos deveres que assumiram, semelhantes ao Semeador, levem, a todos os lares, e plantem em todos os corações, a Semente da fé que salva, erguendo bem alto essa Luz do Evangelho, escondida sob o alqueire dos dogmas e dos falsos ensinos que tanto têm prejudicado a Humanidade! 24 

PARÁBOLA DO JOIO
 “O Reino dos Céus é semelhante a um homem que semeou boa semente no seu campo. Mas, enquanto os homens dormiam, veio um inimigo dele, semeou joio no meio do trigo e retirou-se. Porém, quando a erva cresceu e deu fruto, então apareceu também o joio. Chegando os servos do dono do campo, disseram-lhe: Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Pois donde vem o joio? Respondeu-lhes: Homem inimigo é quem fez isso. Os servos continuaram: Queres, então, que vamos arrancá-lo? Não, respondeu ele; para que não suceda, que, tirando o joio, arranqueis juntamente com ele também o trigo. Deixai crescer ambos juntos até à ceifa; e no tempo da ceifa direi aos ceifeiros: ajuntai primeiro o joio e atai-o em feixes para os queimar, mas recolhei o trigo no meu celeiro.” (Mateus, XIII; 24 - 30.) O homem tem sido, em todos os tempos, o eterno inimigo da Verdade. A todos os jactas da Sua luz, opõe uma sombra para obscurecê-la ou desnaturá-la. O joio está para o trigo, assim como o juízo humano está para as manifestações superiores. Uma doutrina, por mais clara e pura que seja, no mesmo momento em que é concedida ao homem, suscita inimigos que a trucidam, interesseiros e interessados em manter a ignorância que a desvirtuam, revestindo-a de falsas interpretações e desnaturando completamente sua essência puríssima! São como o joio, que amesquinha, transforma, envenena e até mata o trigo! A Doutrina de Jesus, embora de nitidez incomparável, de lógica e clareza sem igual, não podia deixar de sofrer essa malsinada 25 “transubstanciação”, que a tornou esquecida ignorada e incompreendida das gentes. Embora resumindo-se a Religião do Cristo no amor a Deus e ao próximo, no merecimento pelo trabalho, pela abnegação, pelas virtudes ativas, os sacerdotes dela fizeram um princípio de discórdia; degeneraramna em partidos religiosos que se digladiam numa luta tremenda de desamor, de ódio, de orgulho, de egoísmo, destruindo todos os princípios de fraternidade estabelecidos pelo Cristo. Em vez da Religião Imaculada do Filho de Maria, aparecem as religiões aparatosas de sacerdotes preconizando e mantendo cultos pagãos, exterioridades grotescas, dogmas, mistérios, milagres, exaltando o sobrenatural, escravizando a razão e a consciência das massas! Este joio já agora de milênios, e que começou a surgir por ocasião da semeadura do bom trigo, nasceu, cresceu, abafou a bendita semente porque, segundo diz a parábola, quando o Cristo falou, os homens não lhe deram atenção, mas dormiram, deixando de prestar o necessário raciocínio às suas palavras redentoras! E como depois, pela mescla da Palavra do Cristo com as exterioridades com que a revestiram, se fizesse confusão idêntica à do joio e do trigo, logo após nascerem, o Senhor deliberou esperar a ceifa, quer dizer, o fim dos tempos, que deveria apresentar o produto da sua Palavra e os resultados das religiões sacerdotais, com as suas pompas, para que os ceifeiros ficassem encarregados de Queimar o “joio” e recolher o “trigo” ao celeiro. É o que estamos fazendo, e estes escritos elucidativos não têm por fim elucidar a Doutrina do Cristo, que é toda Luz, mas queimar com a chama sagrada da Verdade, o joio malfazejo, reduzi-lo a cinzas, a fim de que o Cristianismo domine, estabelecendo no coração humano o amor a Deus e fazendo prevalecer o espírito de Fraternidade, único capaz de resolver as questões sociais e estabelecer a paz no mundo. 

26 PARÁBOLA DO GRÃO DE MOSTARDA
“O Reino dos Céus é semelhante a um grão de mostarda que um homem tomou e lançou no seu campo; o qual grão é na verdade, a menor de todas as sementes, mas depois de crescida é a maior das hortaliças e faz-se árvore, de tal modo que as aves do céu vêm pousar nos seus ramos.” (Ma teus, VIII, 31-32 – Marcos, IV, 30-32 – Lucas, 18-19.) Consideremos, aqui, o Reino dos Céus como tudo o que está acima e abaixo, à direita e à esquerda de nós, todo esse espaço imenso, infinito, incomensurável, onde se balançam os astros e fulgem as estrelas (*); todo esse Éter que nos parece vazio, mas que, na verdade, encerra multidões de seres e de mundos, onde se ostentam maravilhas da Arte e da Ciência de Deus. (*) Vide também O Espírito do Cristianismo. Para quem o vê da Terra, com os olhos da carne, parece o seu conhecimento insignificante, como o é uma semente de mostarda. Mas, depois que o estudamos, assim como depois que se planta a semente, nossa inteligência se dilata, como se dilata a semente quando germina; transforma-se o nosso modo de pensar, como sói acontecer à semente modificada já em erva; e o conhecimento do Reino dos Céus cresce em nós como cresce a mostarda, a ponto de nos tornarmos um centro de apoio em torno do qual voluteiam os Espíritos, bem assim os homens que sentem a necessidade desse apoio moral e espiritual, da mesma forma que os pássaros, para o seu descanso, procuram as arvores mais exuberantes para gozarem a sombra benéfica das suas ramagens! O grão de mostarda serviu duas vezes para as comparações de Jesus: uma vez comparou-o ao Reino dos Céus; outra, à Fé. O grão de mostarda tem substância e uma semente faz efeito revulsivo. Essa mesma substância se transforma em árvore; dá, depois, muitas sementes e muitas árvores e até suas folhas servem de alimento. 27 Mas é necessária a fertilidade da terra, para que trabalhe a germinação, haja transformação, crescimento e frutificação do que foi semente; e é necessário, a seu turno, o trabalho da semente e da planta no aproveitamento desse elemento que lhe foi dado. Assim acontece com o Reino dos Céus na alma humana; sem o trabalho dessa “semente”, que é feito pelos Espíritos do Senhor; sem o concurso da boa vontade, que e a melhor fertilidade que lhe podemos proporcionar; sem o esforço da pesquisa, do estudo, não pode aumentar e engrandecer-se em nós, não se nos pode mostrar tal como é, assim como a mostarda não se transforma em hortaliça sem o emprego dos requisitos imperiosos para essa modificação. A Fé é a mesma coisa: parece-se com um grão de mostarda quando já é capaz de “transportar montanhas”, mas a sua tendência é sempre para o crescimento, a fim de operar mudança para campo mais largo, mais aberto, de mais dilatados horizontes. A Fé verdadeira estuda, examina, pesquisa, sem espírito preconcebido, e cresce sempre no conhecimento e na vivência do Evangelho de Jesus. O Espiritismo, com seus fatos positivos, vem dar um grande impulso à Fé, desvendando a todos o Reino dos Céus. Assim como o Reinado Celeste abrange o infinito, a Fé é tudo e dela todos precisam para crescer no conhecimento da Vida Eterna! 

28 PARÁBOLA DO FERMENTO
 “O Reino dos Céus é semelhante ao fermento, que uma mulher tomou e escondeu em três medidas de farinha, até ficar toda ela levedada.” (Mateus, XIII, 33 – Lucas, XIII, 20-21.) Não há quem ignore o processo da panificação. Lança-se um tanto de fermento na massa de farinha, mistura-se e espera-se que fique toda levedada, para o que muito concorre o calor. Aparentemente, quem vê a massa não diz que tem fermento; entretanto, depois de algumas horas, a própria massa levedada acusa a presença do mesmo. Assim é o Reino dos Céus: o homem não se pode transformar, de simples e ignorante, em elevado e sábio de um momento para outro, como o levedo não transforma a farinha na mesma hora em que nela é posto. Aos poucos, à medida que ouve a voz dos profetas, a palavra dos emissários do Alto, a inteligência do homem se vai esclarecendo e o seu Espírito se transforma: ele assimila o Reino dos Céus, que à prima facie lhe pareceu um enigma, mas depois se lhe apresentou positivo, racional, lógico. Quem diria que uma só medida de fermento, em três medidas de farinha, leveda a mesma? preciso, porém, lembrar que o calor, não só na farinha para o pão, como também no homem, para a transformação de Espíritos, é indispensável. E este calor pode traduzir-se na atividade que empregamos para progresso que somos chamados a conquistar.

29 PARÁBOLA DO TESOURO ESCONDIDO
 “O Reino dos Céus é semelhante a um tesouro que, oculto no campo, foi achado e escondido por um homem, o qual, movido de gozo, foi vender tudo que possuía e comprou aquele campo.” (Mateus, XIII, 44.) O homem tem resumido a sua tarefa na Terra a procurar “tesouros”, a achar tesouros, a esconder tesouros, a vender o que possui para comprar campos que tenham tesouros. Assim tem acontecido, assim está acontecendo. Para que trabalha o homem, na Terra? Para que estuda? Para que luta, a ponto de matar o seu semelhante? Para possuir tesouros! Jesus, sabendo dos artifícios que o homem emprega na conquista dos tesouros, fez do “tesouro escondido” uma parábola, comparando-o ao Reino dos Céus; fê-lo, naturalmente, para que os que recebessem esses conhecimentos, também empregassem todo o seu talento, todos os seus esforços, todo o seu trabalho, toda a sua atividade, todos os seus sacrifícios, na conquista desse outro “tesouro”, ao qual ele chamou imperecível, lembrando que “a traça e a ferrugem não o corrompem, e os ladrões não o roubam”. O Reino dos Céus é um tesouro oculto ao mundo, porque os grandes, os nobres, os guias e os chefes de seitas religiosas não querem fazê-lo aparecer à Humanidade. Mas, graças à Revelação, aos Ensinos Espíritas, aos Espíritos do Senhor, hoje é muito fácil ao homem achar esse tesouro. Mais difícil lhe pode ser, “vender o que tem e comprar o campo”, isto é, desembaraçar-se das suas velhas crenças, do egoísmo, do preconceito, do amor aos bens terrestres, para possuir os bens celestes. 30 Materializado como está, o homem prefere sempre os bens aparentes e perecíveis, porque os considera positivos; os bens reais e imperecíveis ele os julga abstratos. A Parábola do Tesouro Escondido é significativa e digna de meditação: o homem terreno morre e fica sem seus bens; o homem espiritual permanece para a Vida Eterna e o tesouro do céu, que ele adquiriu é de sua posse permanente.

 31 A PARÁBOLA DA PÉROLA
 “O Reino dos Céus é semelhante a um negociante que buscava boas pérolas; e tendo achado urna de grande valor, foi vender tudo o que possuía e a comprou.” (Mateus, XIII, 45 – 46.) As pérolas constituem enfeites para a gente fina; são raras, por isso são caras. Quem possui grandes e finas pérolas possui tesouro, possui fortuna. Além disso, são jóias muito apreciadas no seu todo, pela sua estrutura, pela sua composição. Os porcos não apreciam, as virtudes das pérolas; preferem milho ou alfarrobas. Se lhes dermos pérolas, eles pisam-nas e submergem-nas no lamaçal em que vivem; por isso disse Jesus: “Não deis pérolas aos porcos.” Certamente já havia o Senhor do Verbo Divino comparado o Reino dos céus a uma pérola de raro valor, quando propôs aquela recomendação a um discípulo que deliberara anunciar a sua Doutrina a um homem-suíno. Na verdade, há homens que são Homens, e há homens que se parecem muito com suínos. O suíno vive exclusivamente para o estômago e para a lama. Os homens suínos também vivem de lama e para o estômago. A estes as “pérolas” nada significam: as alfarrobas melhor lhes sabem. O Reino dos Céus, nos tempos atuais, é incompatível com o Reino do Mundo. Para a aquisição da pérola o homem vendeu tudo o que possuía; para a aquisição da Pérola do Reino dos Céus o homem precisa vender o Reino do Mundo. Há Reino do Mundo, e há Reino dos Céus. Aquele desaparece com as revoluções, ao chamado da morte, ou o guante da miséria. 32 O Reino dos Céus permanece na alma daquele que souber possuí-lo.
 33 PARÁBOLA DA REDE
 “Finalmente, o Reino dos Céus é semelhante a uma rede, que foi lançada ao mar e apanhou peixes de toda espécie: e depois de cheia, os pescadores puxaram-na para a praia; e sentados, puseram os bons em cestos, mas deitaram fora os ruins. Assim será no fim do mundo: sairão os anjos e separarão os maus dentre os justos, e lança-los-ão na fornalha do sofrimento; ali haverá choros e ranger de dentes.” (Mateus, XIII, 47 – 50.) O fim do mundo é o característico dos tempos em que estamos, destes tempos em que a própria fé é encontrada com muita dificuldade nos corações; tempos em que a lealdade, a sinceridade, a verdadeira afeição, o amor, a verdade, andam obscurecidas nas almas; tempos de discórdias, de ódios, de confusão tal, que até os próprios “escolhidos” periclitam (*). (*) Entende-se por escolhido aquele que, pela vivência cristã, já se libertou em grande parte do reino do Mundo; não obstante periclita, ainda pode cair, donde advertência do apostolo Paulo: “Aquele pois que cuida estar em pé, olhe não caia” (I Coríntios, 10:12). É o fim do mundo velho, é o advento do mundo novo; é uma fase que se extingue para dar lugar a outra que vem nascendo. Não é o fim do mundo, como alguns o têm entendido, mas, sim, o fim dos costumes com os seus usos, suas praxes, seu convencionalismo, sua ciência, sua filosofia, sua religião. É uma fase do nosso mundo, que ficará gravada nas páginas da História com letras indeléveis, encerrando um ciclo de existência da Humanidade e abrindo outra página em branco mas trazendo no alto o novo programa de Vida. A rede cheia de peixes de toda a espécie representa a Lei Suprema, que, ministrada a todos, sem exceção, sejam gregos ou gentios, vem trazendo ao Tribunal de Cristo gente de toda a espécie, bons, medianos e maus, para serem julgados de acordo com as suas obras. 34 Os anjos são os Espíritos Superiores, e quem está afeto o poder do julgamento; a fornalha de dor é o símbolo dos mundos inferiores, onde os maus têm de se depurar entre lágrimas e dores, para atingirem uma esfera melhor. Contudo, não se julgue que esta parábola seja para os “outros”, que não os espíritas, ou os crentes no Espiritismo. Parece-nos, até, que os afeta primeiro que a todos os demais, pois que se acham dentro da rede tecida pela pregação dos Espíritos no mundo todo. Quer dizer que não vale só conhecer, é preciso também praticar; não vale estar dentro da rede; é indispensável ser bom! Os que conhecem o amor e não têm amor; os que exigem a lealdade e a sinceridade, mas não as praticam; os que clamam por indulgência e não são indulgentes; os que anunciam a humildade, mas se elevam aos primeiros lugares, deixando o banco do discípulo para se sentarem na cadeira do mestre; todos estes, e ainda mais os perjuros, os convencionalistas, os tíbios e os subservientes, não poderão ter a cotação dos bons, dos humildes, dos que têm o coração reto, dos que cultivam o amor pelo amor, a fé pelo seu valor progressivo, e trabalham pela Verdade para terem liberdade. A Parábola da Rede é a última da série das sete parábolas que o Mestre propôs a seus discípulos; por isso o Apóstolo, ao publicá-la no seu Evangelho, conservou a expressão que o Cristo lhe deu ao propô-la: Finalmente: Ela é a chave com que Jesus quis fechar naqueles corações o ensino alegórico que lhes havia transmitido, ensino bastante explicativo do Reino dos Céus com todas as suas prerrogativas.

 35 PARÁBOLA DA OVELHA PERDIDA “Que vos parece? Se um homem tem cem ovelhas e uma delas se extravia, não deixa as noventa e nove e vai aos montes procurar a que se extraviou? E se acontecer achá-la, em verdade vos digo que se regozija mais por causa desta, do que pelas noventa e nove que não se extraviaram. Assim não é da vontade do vosso Pai que está nos Céus que pereça nenhum desses pequeninos.” (Mateus, XVIII, 12-14 – Lucas, XV, 3-7.) Esta imaginosa parábola parece ser o solene protesto da má interpretação que os sacerdotes têm dado à palavra do Cristo. Não há muito, escreveu-nos um padre romano ser estultícia negar as penas eternas do Inferno, quando nos Evangelhos encontramos, no mínimo, quinze vezes a confirmação dessa eternidade; e conclui que ela não é ensino da Igreja, mas ensino do próprio Evangelho. Jesus previa certamente que seus ensinos e pensamento íntimo seriam desnaturados pelos homens constituídos em agremiações religiosas, e quis, de certa forma, deixar bem patente aos olhos de todos que Ele não poderia ser Representante de um Deus que, proclamando o amor e a necessidade indispensável do perdão cara remissão dos pecados, impusesse, aos filhos por Ele criados, castigos infindáveis, eternos. A parábola mostra bem claramente que as almas transviadas não ficarão perdidas no labirinto das paixões, nem nas furnas onde medram os abrolhos. Como a ovelha desgarrada, elas serão procuradas, ainda mesmo que seja preciso deixar de cuidar daquelas que atingiram já uma altura considerável, ainda mesmo que as noventa e nove ovelhas fiquem estacionadas num local do monte, os encarregados do rebanho sairão ao campo em procura da que se perdeu. 36 O Pai não quer a morte do ímpio; não quer a condenação do mau, do ingrato, do injusto, mas sim a sua regeneração, a sua salvação, a sua vida, a sua felicidade. Ainda que seja preciso, para a regeneração do Espírito, nascer ele na Terra sem mão ou sem pé entrar na vida manco ou aleijado; ainda que lhe seja preciso renascer no mundo sem os olhos, por causa dos “tropeços”, por causa dos “escândalos”, a sua salvação é tão certa como a da ovelha que se havia perdido e lembrada na parábola, porque todos esses pobres que arrastam o peso da dor, os seus guias e protetores os assistem para conduzi-los ao porto seguro da eterna bonança. Leitor amigo: quando vos falarem os sacerdotes, de Inferno eterno, perguntai-lhes que relação tem a Parábola da Ovelha Perdida com esse dogma monstruoso, que desnatura e inutiliza todos os atributos divinos.

37 PA RÁBOLA DO CREDOR INCOMPASSIVO
 “Então Pedro, aproximando-se de Jesus lhe perguntou: Senhor, quantas vezes pecará meu irmão contra mim, que lhe hei de perdoar? Será até sete vezes? Respondeu-lhe Jesus: Não te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete vezes. “Por isso o Reino dos Céus é semelhante a um rei, que resolveu ajustar contas com os seus servos. E tendo começado a ajustá-las, trouxeram um que lhe devia dez mil talentos. Não tendo, porém, o servo com que pagar, ordenou o seu Senhor que fossem vendidos ele, sua mulher, seus filhos e tudo quanto possuía, e que se pagasse à dívida. “O servo, pois, prostrandose, o reverenciava dizendo: Tem paciência comigo, que te pagarei tudo! E o Senhor teve compaixão daquele servo, deixou-o ir e perdoou-lhe a dívida. Tendo saído, porém, aquele servo, encontrou um de seus companheiros, que lhe devia cem denários; e, segurando-o, o sufocava, dizendo-lhe: Paga o que me deves! E este, caindo-lhe aos pés, implorava: Tem paciência comigo, que te pagarei! Ele, porém, não o atendeu; mas foi-se embora e mandou conservá-lo preso, até que pagasse a dívida. “Vendo, pois, os seus companheiros o que se tinha passado, ficaram muitíssimo tristes, e foram contar ao Senhor tudo o que havia acontecido. Então, o Senhor chamando-o, disse-lhe: Servo malvado, eu te perdoei toda aquela dívida, porque me pediste; não devias tu também ter compaixão do teu companheiro, como eu tive de ti? E irou-se o seu Senhor e o entregou aos verdugos, até que pagasse tudo o que lhe devia. Assim também meu Pai Celestial vos fará, se cada um de vós do íntimo do coração não perdoar a seu irmão.” (Mateus, XVIII, 21 – 35.) No capítulo VI do Sermão do Monte, segundo Mateus, versículo 5 a 15, ensinou Jesus a seus discípulos e à multidão que se apinhava para ouvir os seus ensinos, a maneira como se deveria orar; e aproveitou o 38 ensejo para resumir num excelente e substancioso colóquio com Deus, a súplica que ao Poderoso Senhor devemos dirigir cotidianamente. O Mestre renegava as longas e intermináveis rezas que os escribas e fariseus do seu tempo proferiam, de pé nas sinagogas e nos cantos das ruas, para serem vistos pelos homens. Observou a seus ouvintes que tal não fizessem, mas que, fechada a porta do seu quarto, dirigissem, em secreto, a súplica ao Senhor. A fórmula de oração que lhes deu encerra, ao mesmo tempo, pedidos e compromissos que teriam de assumir os suplicantes, e dos quais se destaca o que constitui objeto dos ensinos que se acham contidos na Parábola do Credor Incompassivo: “Perdoa as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores.” Do cumprimento ou não desta obrigação, depende o deferimento ou indeferimento do nosso requerimento. Além disso, nesse dever se resume toda a confissão, comunhão, extrema-unção, etc. Aquele que confessar, comungar, receber a unção, mas não perdoar os seus devedores, não será perdoado; ao passo que, o que perdoar será imediatamente perdoado, independentemente das demais praxes recomendadas pela Igreja de Roma, ou quaisquer outras Igrejas, como meio de salvação. Acontece ainda que o perdão, conforme o Cristo ensinou a Pedro, deve ser perpétuo, e não concedido uma, duas, ou sete vezes. Daí vem a Parábola explicativa da concessão que devemos fazer ao nosso próximo, para podermos receber de Deus o troco na mesma moeda. Vemos que o primeiro servo a chegar foi justamente o que mais devia: 10.000 talentos! Soma fabulosa naquele tempo, para um trabalhador, não só naquele tempo como também hoje, pois valendo cada talento Cr$ 1.890,00 em moeda brasileira, 10.000 atingia a respeitável soma de Cr$ 18.900.000,00 (dezoito milhões e novecentos mil cruzeiros.) Se algum servo, que só tivesse mulher, filhos e alguns haveres ficasse devendo essa 39 importância para o Vaticano, depois de entregue ao braço forte seria irremissivelmente condenado às penas eternas do Inferno! Jesus escolheu mesmo essa quantia avultada para melhor impressionar seus ouvintes sobre a bondade de Deus e a natureza da doutrina que em nome do Senhor estava transmitindo a todos. Nenhum outro devedor foi lembrado na Parábola, porque só o primeiro era bastante para que se completasse toda a lição. Pois bem, esse devedor, vendo-se ameaçado de ser vendido com ele sua mulher e seus filhos, sem eximir-se do pagamento, pediu moratória, valendo-se da benevolência do rei; este, cheio de compaixão, perdoou-lhe a dívida, isto, suspendeu as ordens que havia dado para que tudo quanto possuía, mulher, filhos e o mesmo servo, fosse vendido para pagamento, visto como ele se propunha a pagar com prazo. Mas, continua a parábola, aquele devedor, que havia recebido o perdão, logo ao sair encontrou um de seus companheiros que lhe devia cem denários, ou seja Cr$ 31,50 da nossa moeda, verdadeira bagatela que para ele, homem devedor de aproximadamente 19 milhões de cruzeiros, por certo nada representava; e exigiu do devedor, violentamente, o seu dinheiro! Ao desdobrar-se àquela cena, os seus companheiros que haviam presenciado tudo o que se passara, indignaram-se e foram contar ao rei o acontecido. Dai a nova resolução do Senhor: entregou o servo malvado aos verdugos, a fim de que o fizessem trabalhar à força, até que lhe pagasse tudo o que lhe devia. Esta última condição é também interessante: paga a dívida, recebe o devedor a quitação; o que quer dizer: sublata causa, tolitur effectus. A dívida deve forçosamente constar de um certo número de algarismos; subtraídos estes por outros tantos semelhantes, o resultado há de ser 0. 40 Quem deve 2 e paga 2, nada fica devendo; quem deve dezoito milhões e novecentos mil cruzeiros e paga dezoito milhões e novecentos mil cruzeiros, não pode continuar a ficar pagando dívida. Isto é mais claro que água cristalina. Termina Jesus a Parábola afirmando: “Assim também meu Pai Celestial vos fará, se cada um de vós do íntimo do coração não perdoar a seu irmão”. Sem dúvida, é tão difícil a um pecador pagar dezoito milhões e novecentos mil pecados, como a um trabalhador pagar dezoito milhões e novecentos mil cruzeiros. Mas, tanto um como o outro têm a Eternidade diante de si; o que não se pode fazer numa existência, far-se-á em duas, vinte, cinqüenta, far-se-á na Outra Vida, em que o Espírito não está inativo. Tudo isso está de acordo com a bondade de Deus, aliada à sua justiça; o que não pode ser é o indivíduo pagar eternamente e continuar a pagar, depois de já ter pago. A lei do perdão é inflexível, reina no Céu tal como a prescreveu na Terra o Mestre Nazareno, cujo Espírito, alheio aos princípios sacerdotais, aos dogmas e mistérios das Igrejas, deve ser ouvido, respeitado, amado e servido.

 41 PARÁBOLA DOS TRABALHADORES DA VINHA
 “Porque o Reino dos Céus é semelhante a um proprietário, que saiu de madrugada a assalariar trabalhadores para a sua vinha. E feito com os trabalhadores o ajuste de um denário por já, mandou-os para a sua vinha. Tendo saído cerca da hora terceira, viu estarem outros na praça desocupados, e disse-lhes: de também vós para a minha vinha, e vos darei o que for justo. E eles foram. Saiu outra vez cerca da hora sexta, e da nola, e fez o mesmo. E cerca da undécima, saiu e achou outros que lá estavam e perguntou-lhes: Por que estais aqui todo o ia desocupados? Responderam-lhe: Porque ninguém nos assalariou. Disse-lhes: Ide também para a minha vinha. A tarde, disse o dono da vinha ao ser administrador: Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, começando pelos últimos e acabando pelos primeiros. Tendo chegado os que tinham sido assalariados cerca da undécima hora, receberam um denário cada um. E vindo os primeiros, pensavam que haviam de receber mais; porém, receberam igualmente um denário cada um. Ao receberem-no, murmuravam contra o proprietário, alegando: Estes últimos trabalharam somente uma hora, e os igualaste a nós, que suportamos o peso do dia e o calor extremo! Mas o proprietário disse a um deles: Meu amigo, não te faço injustiça; tão ajustaste comigo por um denário? Toma o que é teu e vai embora, pois quero dar a este último tanto como a ti. Não me é licito fazer o que me apraz do que é meu? Acaso o teu olho é mau, porque eu sou bom? Assim os últimos serão os primeiros, os primeiros serão os últimos.” (Mateus XX, 1 – 16.) As condições essenciais para os trabalhadores são: a constância, o desinteresse, a boa vontade e o esforço que azem no trabalho que assumiram. Os bons trabalhadores e distinguem por estes característicos. O mercenário trabalha pelo dinheiro; seu único fito, sua única aspiração é receber o salário. O verdadeiro operário, o artista, trabalha por 42 amor à Arte. Assim é em todas as ramificações dos conhecimentos humanos: há os escravos do dinheiro e há o operário do progresso. Na lavoura, na indústria, como nas Artes e Ciências, destacam-se sempre o operário e o mercenário. O materialismo, a materialidade, a ganância do ouro arranjaram, na época em que nos achamos, mais escravos do que a Vinha arranjou mais obreiros. Por isso, grande é a seara e poucos são os trabalhadores! Na Parábola, pelo que se depreende, não se faz questão da quantidade do trabalho, mas sim da qualidade, e, ainda mais, da permanência do obreiro até o fim. Os que trabalharam na Vinha, desde a manhã até à noite, não mereceram maior salário que os que trabalharam uma única hora, dada a qualidade do trabalho. Os que chegaram por último, se tivessem sido chamados à hora terceira teriam feito, sem dúvida, o quádruplo do que fizeram aqueles que a essa hora foram para o serviço. Daí a lembrança do Proprietário da Vinha de pagar primeiramente os que fizeram aparecer melhor o serviço e mais desinteressadamente se prestaram ao trabalho para o qual foram chamados. Esta Parábola, em parte, dirige-se muito bem aos espíritas. Quantos deles por ar andam, sem estudo, sem prática, sem orientação, fazendo obra contraproducente e ao mesmo tempo abandonando seus interesses pessoais seus deveres de família, seus deveres de sociedade! Na Seara chega-se a encontrar até os vendilhões que apregoam sua mercadoria pelos jornais como o mercador na praça pública, sempre visando bastardos Interesses. Ora são médiuns mistificadores que exploram a saúde pública; ora são “gênios” capazes de abalar os céus para satisfazerem a curiosidade dos ignorantes. Enfim são muitos os que trabalham, mas poucos os que ajuntam, edificam, tratam, como devem, a Vinha que foi confiada à sua ação. 43 Há uma outra ordem de espíritas que nenhum proveito tem dado ao Espiritismo. Encerram-se entre quatro paredes, não estudam, não lêem, e passam a vida a doutrinar espíritos. Não há; dúvida de que trabalham estes obreiros; mas, pode-se comparar a sua obra com a dos que se expõem ao ridículo, ao ódio, à injúria, à calúnia, no largo campo da propaganda? Podem-se comparar os enclausurados numa sala, fazendo trabalhos secretos e às mais das vezes improfícuos, com os que sustentam, aqui fora, renhida luta e se batem, a peito descoberto, pelo triunfo da causa que desposaram? Finalmente, a Parábola conclui com a lição sobre os olhos maus: os invejosos que cuidam mais de si próprios que da coletividade; os personalistas, os egoístas que vêem sempre mal as graças de Deus em seus semelhantes, e a querem todas para si. Na História do Cristianismo realça a Parábola da Vinha com os característicos dos seus obreiros. “O que era é o que é”, diz o Eclesiastes; e o que se passou é o que se está passando agora com a Revelação Complementar do Cristo. Há os chamados pela madrugada, há os que chegaram à hora terceira, à hora sexta, a nona e a undécima. Na verdade estamos na hora undécima e os que ouvirem o apelo e souberem trabalhar como os da hora undécima de outrora, serão os primeiros a receber o salário, porque agora como então, o pagamento começará pelos últimos. Ai dos que clamarem contra a vontade do Senhor da Vinha! Ai dos malandros, dos mercenários, dos inscientes!. 

44 PARÁBOLA DA FIGUEIRA ESTÉRIL
 “Pela manhã, ao voltar Jesus à cidade, teve fome. E vendo uma figueira à beira do caminho, dela se aproximou, e não achou nela senão folhas; e disse-lhe: Nunca jamais nasça de ti frutos, no mesmo instante secou a figueira. E vendo isto os seus discípulos maravilharam-se e perguntaram: Como é que repentinamente secou a figueira? Respondeulhes Jesus: Em verdade vos digo que se tiverdes fé e não duvidardes, fareis não só o que foi feito à figueira, mas até se disserdes a este monte: Levanta te e lança-te ao mar, isto será feito; e tudo o que, com fé, pedirdes em vossas orações, haveis de receber.” (Mateus, XXI 18-22. – Lucas, XIII, 6-9.) Magnífica parábola! Estupendo ensinamento! Qual lições aprendemos nestes poucos versículos do Evangelho! Se encararmos a narrativa pelo lado científico, observaremos a morte de uma árvore em virtude de uma grade descarga de fluidos magnéticos, que imediatamente secaram a mesma. A Psicologia Moderna, com suas teorias edificantes e substanciosas, e com seus fatos positivos, mostra-nos o poder do magnetismo que utiliza os fluidos do Universo para destruir, conservar e vivificar. A cura das moléstias abandonadas pela Ciência Oficial e a mumificação de cadáveres, pelo magnetismo, se acham registrados nos anais da História, não deixando mais dúvida a esse respeito. No caso da figueira não se trata de uma conservação mas, ao contrário, de uma destruição, semelhante à destruição das células prejudiciais e causadoras de enfermidades, como na cura dos dez leprosos, e outras narradas pelos Evangelhos. A figueira não dava fruto porque sua organização celular era insuficiente ou deficiente, e Jesus, conhecendo se mal, quis dar uma lição 45 a seus discípulos, não só para lhes ensinar a terem fé, mas também para lhes fazer ver que os homens e as instituições infrutíferas, como aquela árvore, sofreriam as mesmas conseqüências. Pelo lado filosófico, realça da parábola a necessidade indispensável da prática das boas obras, não só pelas Instituições, como pelos homens. Um indivíduo, por mais bem vestido e mais rico que seja, encaramujado no seu egoísmo, é semelhante a uma figueira, da qual, em nos aproximando, não vemos mais que folhas. Uma instituição, ou uma associação religiosa, onde se faça questão de estatuto, de cultos, de dogmas, de mistérios, de ritos, de exterioridades, mas que não pratique a caridade, não exerça a misericórdia; não dê comida aos famintos, roupa aos nus, agasalho e trato aos doentes; não promova a propaganda do amor ao próximo, da necessidade do erguimento da moral, do estabelecimento a verdadeira fé, essa instituição ou associação, embora tenha nome de religiosa, embora se diga a única religião fora da qual não há salvação (como acontece com o Catolicismo de Roma), não passa de uma “figueira enfolhada, mas, sem frutos” O de que precisamos da árvore são os frutos. O de que precisamos da religião são as boas obras. Os dogmas só servem para obscurecer a inteligência; os sacramentos, para falsear os ensinos do Cristo; as festas, passeatas, procissões, imagens, etc., para consumir dinheiro em coisas vãs e iludir o povo, com um culto que foi condenado pelos profetas dos tempos antigos, no Velho Testamento, e por Jesus Cristo, no Novo Testamento. A Religião do Cristo não é a religião das “folhas” mas, sim, a dos frutos! A Religião do Cristo não consiste nesse ritual usado pelas religiões humanas. A Religião do Cristo é a da Caridade, é a do Espírito é a da Verdade! 46 A fé que o Cristo preconizou, não foi, portanto, a fé em dogmas católicos ou protestantes, mas, sim, a fé na Vida Eterna, a fé na existência de Deus, a fé, isto é, a convicção da necessidade da prática da Caridade! Aquele que tiver essa fé, aquele que souber adquiri-la, tudo o que pedir em suas orações, sem dúvida receberá, porque limitará seus pedidos àquilo que lhe for de utilidade espiritual, assim como se tornará apto a secar figueiras, dessas figueiras que perambulam nas ruas seguidas de meia dúzia de bajuladores; dessas figueiras, como as religiões sem caridade, que iludem incautos com promessas ilusórias, e com afirmações temerosas sobre os destinos das almas. A figueira sem frutos é uma praga no reino vegetal, assim como os egoístas e avarentos são pragas na Humanidade, e as religiões humanas são pragas prejudicialíssimas à Seara do Senhor. Não dão frutos; só contêm folhas. *** Estudada pelo lado científico, a parábola é um portento, porque, de fato, Jesus, com uma palavra, fez secar a figueira. Nenhum sábio da Terra é capaz de imitar o Mestre! Encarada pelo lado filosófico, a lição da figueira que secou é um aviso do que vai acontecer aos homens semelhantes à figueira sem frutos; e às religiões que igualmente só têm folhas! Nesta Parábola aprende-se ainda que a esterilidade, parece, é mal inevitável! Em todas as manifestações da natureza aqui e ali, se vê a esterilidade como que desnaturando a criação ou transviando a obra de Deus! Nas plantas, nos animais, nos humanos, a esterilidade e é a nota dissonante, que estorva a harmonia universal. Na Ciência, na Religião, na Filosofia, até na Arte e a Mecânica, o ferrete da esterilidade não deixa de gravar o seu sinal infamante! 47 Acontece, porém, que chegado o tempo propício, a obra estéril desaparece para não ocupar inutilmente o campo de ação onde se implantou. A figueira estéril da Parábola é a exemplificação de todas essas manifestações anômalas que se desdobram às nossas vistas. Para não sair do tema em que devemos permanecer constitui o objeto deste livro, vamos comparar a figueira estéril com as Ciências humanas e as religiões sacerdotais A primeira vista não parece ao leitor que a Parábola adapta perfeitamente a estas manifestações do pensamento absoluto e autoritário? Vemos uma árvore, reconhecemos nessa árvore uma figueira; está bem entroncada, bem enfolhada, bem adubada, vamos procurar figos e nem uma fruta encontramos! Vemos uma segunda “árvore”, que deve ser a da Vida, reconhecemos nela uma religião que já permanece há muitos anos e vem sendo transmitida de geração a geração; procuramos nela verdades que iluminem, consolos que fortifiquem, ensinos que instruam, fatos que demonstrem, e nada disso achamos, a despeito da grande quantidade de adubo que lançam em redor dessa mesma “árvore”! O que falta ao Catolicismo Romano para assim se encontrar desprovido de frutos? Faltam-lhe porventura igrejas, fiéis, dinheiro, livros, sabedoria? Pois não tem ele seus sacerdotes no mundo todo, suas catedrais pomposas, seus templos? Não tem elo com o seu papa a maior fortuna que há no mundo, completamente estéril, quando deveria converter esses tesouros, que os ladrões alcançam, naquele outro tesouro do Evangelho, inatingível aos ladravazes e aos vermes? Não tem ele milhões e milhões de adeptos que sustentam toda a sua hierarquia? 48 Por que não pode a Igreja dar frutos demonstrativos do verdadeiro amor, que é imortal? Por que não pode demonstrar a imortalidade da alma, que é a melhor caridade que se pode praticar? E o que diremos dos seus ensinos arcaicos e irrisórios, semelhantes às folhas enferrujadas de uma figueira velha? do seu dogma do Inferno eterno; do seu artigo de fé sobre a existência do Diabo; dos seus sacramentos e mistérios tão caducos e absurdos, que chegam a fazer de Deus um ente inconcebível e duvidoso?! E assim como é a religião, é a ciência de homens, desses mesmos homens que, embora completamente divergentes dos ensinos religiosos dos padres, por preconceito e por servilismo andam com eles de braços dados, como se cressem na “fé” pregada pelos sacerdotes! Essa ciência terrena que todos os dias afirma e todos os dias se desmente! Essa ciência que ontem negou o movimento da Terra e hoje o afirma; que preconizou a sangria para depois condená-la; que proclamou as virtudes do emético para anos depois execrá-lo como um deprimente; que hoje, de seringa em punho, transformou o homem num laboratório químico, para, amanhã ou depois, condenar como desumano esse processo! E o que falta à Ciência para solucionar esse problema da morte, que lhe parece como fantasma funesto? Faltar-lhe-á “adubo”? Mas não estão aí tantos sábios? não tem ela recursos disponíveis para investigação e experiência? não lhe aparecem a todos os momentos fatos e mais fatos de ordem supra-materiais, meta-materiais para serem estudados com método? Senhor! Está vencido o ano que concedeste para que cavássemos em roda da “árvore” e deitássemos adubo para alimentar e fortificar suas raízes! Ela não dá mesmo frutos e os adubos que temos gasto só têm servido para tornar a árvore cada vez mais frondosa e enfolhada, prejudicando assim o já pequeno espaço de terreno! Manda cortá-la e recomenda a teus servos que não só o façam, mas que também lhe arranquem as raízes! Ela ocupa terreno inutilmente. 49 Em três dias faremos nascer em seu lugar uma que preencha os seus fins, e tantos serão seus frutos que a multidão que nos rodeia não vencerá apanhá-los! *** A esterilidade é mal incurável, que se manifesta nas coisas físicas e metafísicas. Há pessoas que são estéreis em sentimentos afetivos, outras em atos de generosidade, outras o são para as coisas que afetam a inteligência. Por mais que se ensinem, por mais que se exaltem, por mais que se ilustrem, as mesmas, permanecem como a figueira da Parábola: não há esterco, não há adubos, não há orvalho, não há água que as façam frutificar! Estas, só o fogo tem poder sobre elas! 

50 PARÁBOLA DOS DOIS FILHOS
 “Um homem tinha dois filhos: chegando ao primeiro, disse: Filho, vai trabalhar hoje na minha vinha. Ele respondeu: Irei, Senhor; e não foi. E chegando ao segundo, disse-lhe o mesmo. Porém este respondeu: Não quero; mais tarde, tocado de arrependimento, foi. Qual dos dois fez a vontade do Pai? Responderam eles o segundo. Declarou-lhes Jesus: Em verdade vos digo que os publicanos e as meretrizes entrarão primeiro que vós no Reino de Deus.” (Mateus, XXI, 28–31.) Estas duas personalidades revelam perfeitamente as suas qualidades em suas palavras e ações. O primeiro filho, convidado pelo Pai a trabalhar na sua vinha, disse que ia mas não foi. O segundo disse que não ia, mas foi. O primeiro é a personificação da crença (credo) sem obras. O segundo é o tipo do homem inteligente que, negando-se ao trabalho espiritual, depois de haver raciocinado e tirado suas conclusões, transformou o não em sim, não com a palavra abstrata, a crença, a obediência cega, mas por um esforço intelectual e pelas obras que deliberou fazer, “trabalhando na vinha”. Ensina esta Parábola que a vontade de Deus é que trabalhemos não só em proveito nosso, mas em proveito dos nossos semelhantes: ao passo que não é vontade de Deus crermos sem trabalho, isto é, cegamente, sem obras. A crença cega é a crença dos anciãos do Povo, dos velhos rotineiros e dos sacerdotes, pois são estes que Jesus disse que os publicanos e as meretrizes lhes eram ainda superiores, tanto assim que os precederiam no Reino dos Céus. A Parábola, na parte que se refere ao filho que disse: “irei, mas não foi”, entende também com esses anciãos e sacerdotes que, assumindo a tarefa de guiar para a verdade, os moços e os que lhes estão 51 sujeitos, se mantêm num exclusivismo condenável, apagando, até das almas, alguma centelha de fé que lhes foi doada. Enfim, o filho que tardou, e disse que não ia, mas foi — entende com esses publicanos e meretrizes que demoram, como é sabido, mas, afinal, mudam de vida e se tornam, as mais das vezes, grandes obreiros da Seara Divina!

52 PARÁBOLA DOS LAVRADORES MAUS OU DOS RENDEIROS INFIÉIS
 “Havia um proprietário que plantou uma vinha, cercou-a com uma sebe, cavou aí um lagar, edificou uma torre e arrendou-a a uns lavradores e partiu para outro país. Ao aproximar-se o tempo dos frutos, enviou seus servos aos lavradores, para receber os frutos que lhe tocavam. Estes, agarrando os servos, feriram um, mataram outro e a outro apedrejaram. Enviou ainda outros servos em maior número; e trataram-nos do mesmo modo. Por último, enviou-lhes seu filho, dizendo: Terão respeito ao meu filho. Mas, os lavradores, vendo-o, disseram entre si: este é o herdeiro; vinde, matemo-lo e apoderemo-nos da sua herança: e, agarrando-o, lançaram-no fora da vinha e mataram-no. Quando, pois, vier o Senhor da vinha, que fará àqueles lavradores? Responderam-lhe: Fará perecer horrivelmente a estes malvados, e arrendará a vinha a outros, que lhe darão os frutos no tempo próprio.” (Mateus, XXI, 33 – 42. – Marcos, XII, 1 – 9 – Lucas, XX, 9 – 16.) A Parábola acima é a prova da inigualável presciência do Filho de Deus, assim como é a magistral sentença que se havia de cumprir no nosso século contra os “rendeiros infiéis”, que têm devastado a nossa seara. Um proprietário plantou uma vinha, cercou-a com um tapume feito de ramos e troncos de árvores; assentou um lagar (local com todos os petrechos para a fabricação de vinho) e edificou uma “torre” (grande edifício com proteção contra os ataques inimigos). De maneira que a fazenda estava completa, tudo preparado: terras de sobra, parreiras em grande quantidade, lagar, tanques, tonéis — tudo o que era preciso para a fabricação do vinho. Casa de moradia com toda a comodidade e conforto” Mas, tendo de ausentar-se o proprietário, arrendou a herdade a uns lavradores; no tempo da colheita dos frutos 53 mandaria receber o produto do arrendamento, ou seja, os frutos que lhe tocavam” O contrato foi passado e muito bem redigido: selado, registrado e com as competentes testemunhas. Por ocasião da primeira colheita, o Senhor da vinha mandou que seus empregados fossem receber os frutos que lhe tocavam. Os rendeiros, em vez de darem conta do depósito; que lhes fora confiado, agarraram os emissários, feriram um, apedrejaram outro e mataram o seguinte. Na outra colheita, o proprietário da herdade tornou a mandar outros emissários, que tiveram a mesma sorte dos primeiros. Vendo o dono da herdade o que acontecera com seus emissários, julgou mais acertado delegar poderes ao próprio filho, porque, com certeza, os respeitariam, e o enviou a ajustar contas com os arrendatários”. Mas os lavradores, em vendo este chegar à propriedade, combinaram entre si e deliberaram matá-la, porque, diziam; “este é o herdeiro, vinde, matemo-lo e apoderemo-nos da sua herança”. E assim fizeram: tiraram-no fora da vinha e o mataram”. “Quando chegar o Senhor da Vinha, o que fará àqueles lavradores?” — perguntou Jesus ao propor a parábola. E a resposta veio em seguida: “Fará perecer os malvados, os arrendatários dolosos, e entregará a vinha a outros, que lhe darão os frutos em tempo próprio.” *** Parábola é a exposição ou a pintura de uma coisa em confronto com outra de relação remota, ou de sentido oculto ou invisível. Jesus tinha por costume, para explicar aquilo que escapa à compreensão vulgar, usar das parábolas, a fim de se tornar mais compreendendo. 54 Nesta Parábola dos Lavradores Maus, rendeiros infiéis, quis Jesus explicar a soberania da ação divina que às vezes tarda, mas não falha; e quis ainda mostrar a seus discípulos quem são os lavradores que prejudicam a sua seara. *** A seara é a Humanidade; o proprietário é Deus; a vinha que ele plantou é a Religião; o lagar são os meios de purificação espiritual que ele concede; a Casa que edificou é o mundo, os lavradores que arrendaram a lavoura são os sacerdotes de todos os tempos, desde os antigos que sacrificavam o sangue dos animais, até os nossos contemporâneos. Os primeiros servos que foram feridos, apedrejados e sacrificados, são os profetas da Antiguidade, que passaram por duras provações: Elias, Eliseu, Daniel, que foi posto na cova dos leões; o próprio Moisés, que sofreu com os sacerdotes do Faraó e com os israelitas fanatizados que chegaram a fundir um bezerro de ouro para adorar, contra a Lei do Senhor; depois veio João Batista, que foi degolado; e depois outros servos, que passaram pelos mesmos sofrimentos dos primeiros — apóstolos e profetas como Estevão, que foi lapidado; Paulo, Pedro, João, Tiago, que sofreram martírios, e todos os demais que não têm acompanhado as concepções sacerdotais. O Filho do Proprietário, que foi morto pelos rendeiros que se apossaram da sua herança, é Jesus Cristo, Senhor Nosso, que sofreu o martírio ignominioso da cruz. E, de acordo com as previsões da Parábola, os tais sacerdotes se apossaram da herança com a qual se locupletam fartamente, deixando a Seara abandonada e a Vinha sem frutos para o Proprietário. Nas condições em que se acha a Seara, poderá o Senhor deixar a sua Vinha entregue a essa gente, a esses rendeiros inescrupulosos e maus? 55 Estamos certos de que se cumprirá brevemente a última previsão da Parábola: “O Senhor tomará a Vinha desses malvados e a arrendará a outros, que lhe darão os frutos no tempo próprio”. *** A confusão religiosa é a mais espessa escuridão que infelicita as almas. A crença é como o fruto da videira que alimenta, encoraja e vivifica. Assim como este alimenta o corpo, aquela alimenta alma. A Religião de Jesus Cristo não é o culto, as exterioridades, os sacramentos, a fé cega; também não é o fogo que aniquila e consome o mal que vence o bem, o Diabo que vence a Deus. A Religião de Jesus Cristo é o bálsamo que suaviza, é a caridade que consola, é o perdão que redime, é a luz que ilumina; não é o aniquilamento, mas a Vida não é o corpo mas, sim, o Espírito. A Religião de Jesus Cristo deve, pois, ser ministrada em espírito e verdade e não em dogmas e com exterioridades aparatosas, para que possa ser compreendida, observada e praticada pelo Espírito. O corpo é nada; o Espírito é tudo. O corpo existe porque o Espírito aciona; o vivifica e o movimenta. No dia em que o Espírito dele se separa, nenhuma vida mais resta a esse invólucro, a esse instrumento. Que é o violino sem o músico? Que é o relógio sem que se lhe dê corda? Que é a máquina sem maquinista? O corpo sem o Espírito é morto e se desagrega, como uma casa que cai e se converte em escombros. O corpo “pulvis est et in pulveris reverteris”. E se assim é, qual o efeito dos sacramentos e práticas sibilinas que não atingem o Espírito? O princípio da Religião é a Imortalidade e os rendeiros da Vinha têm por dever salientar e demonstrar este princípio, para que o Templo da 56 Religião, assentado sobre esta base inamovível, abrigue com a Verdade os corações que desejam a paz e a felicidade. Os pastores e os sacerdotes, “arrendatários da Vinha”, “maus obreiros” que conspurcam os sentimentos cristãos, transformando a Religião de Jesus em missas, imagens, procissões, aparatos, músicas, girândolas e sacramentos, serão chamados às contas e o látego da Verdade desde já os vem expulsando da herdade, que será entregue a outros, para que os frutos da Vinha sejam dados aos famintos de justiça, aos deserdados de consolação, aos que procuram a luz que encaminha e conduz à perfeição. Desde tempos que vão longe, a Religião tem sido causa de abjeta exploração. O sacerdócio, por várias vezes, tem feito periclitar o sentimento religioso. A desgraça da Religião tem sido, em todas as épocas, o padre. O padre hebreu, o padre egípcio, o padre budista, o padre brâmane; sempre o padre, a corporação eclesiástica, com toda a sua hierarquia, a sua escolástica, os seus princípios rígidos, os seus cultos aparatosos, os seus sacramentos arcaicos. O sacerdócio, tornando-se arrendatário da Vinha, como tem acontecido, só conhece um “deus” a quem obedece cegamente: “deus” constituído eclesiasticamente e tirado ou escolhido de um dos seus próprios membros. Todas as religiões têm tido e continuam a ter o seu papa, o seu maioral, o seu patriarca, o seu chefe a quem todos prestam obediência em detrimento do Supremo Senhor e Criador. Daí a luta cruenta que o sacerdotalismo tem desenvolvido contra os profetas em todas as épocas. Esta Parábola é a comparação de todas as lutas que os gênios, os grandes missionários, os profetas que falam em nome da Divindade e da Religião, têm sustentado contra a cleresia. Desde que o Grande Proprietário plantou na Terra a sua Vinha; desde que fez brilhar no mundo o Sol vivificador da Religião, cercando a Vinha com uma sebe, aí estabelecendo um lagar e edificando uma torre; desde que os princípios religiosos foram estabelecidos e ficaram gravados nos 57 Códigos dos divinos preceitos, os lavradores maus dela se apoderaram como rendeiros relapsos, deixando perecer as videiras e massacrando os enviados que em nome do Senhor lhes vinham pedir ou reclamar, como o fazemos hoje, os frutos da Vinha! Os servos do Proprietário da Lavoura eram presos, feridos e mortos. A pretexto de heresia e apostasia, queimaram corpos como quem queima lenha seca e verde; infligiram-lhes os mais duros suplícios, tisnando de sangue as páginas da História do nosso mundo. Nem o Filho de Deus, cuja parábola premonitória de morte acabamos de ler, nem Ele foi poupado pela classe sacerdotal, que tinha por Pontífices Anás e Caifás, em conluio com os governos da época. A classe sacerdotal, que nada fez à Humanidade e ainda fascinou os homens com os seus cultos aparatosos e seus dogmas horripilantes, é precisamente o que constitui, em sua linha geral, os “lavradores maus” da parábola. Estão eles muito bem representados nesses obreiros fraudulentos e mercenários que proliferam no mundo todo, vendendo a fé, a salvação, as graças. Que fará o Proprietário da Vinha a tão maus obreiros? O resultado não pode ser outro: “fa-los-á perecer, tirar-lhes-á o poder que lhes concedeu e a entregará a outros, que darão os frutos no tempo próprio.” Felizmente chegou também a época da realização da premonição do Cristo exarada nos Evangelhos. Os Espíritos da Verdade baixam ao mundo, uns tomam um invólucro carnal, e outros, através do véu que separa as duas vidas, vêm se apossar da Vinha, para que ela dê os resultados designados pelo Senhor de Todas as coisas. O sacerdócio cai, mas a Religião prossegue; os dogmas são abatidos, mas a Verdadeira Fé aparece, robustecendo consciências, consolando corações, e, principalmente, fazendo raiar na Terra a aurora da 58 Imortalidade, para realçar o Deus Espírito, o Deus Justo, o Deus Poderoso e Sábio que reina em todo o Universo. 

59 PARÁBOLA DAS BODAS
 “De novo começou Jesus a falar em parábolas, dizendo-lhes: o Reino dos Céus é semelhante a um rei, que celebrou as bodas de seu filho. E enviou os seus servos a chamar os convidados para a festa, e estes não quiseram vir. Enviou ainda outros servos com este recado: Dizei aos convidados: Tenho já preparado o meu banquete; as minhas reses e os meus cevados estão mortos, e tudo está pronto; vinde às bodas. Mas eles não fizeram caso e foram, um para o seu campo, outro para o seu negócio; e os outros agarrando os servos os ultrajaram e mataram. Mas irou-se o rei, e mandou as suas tropas exterminar aqueles assassinos e incendiar a sua cidade. Então disse aos servos: As bodas estão preparadas, mas os convidados não eram dignos; ide, pois, às encruzilhadas dos caminhos, e chamai para as bodas a quantos encontrardes. Indo aqueles servos pelos caminhos, reuniram todos os que encontraram, maus e bons; e a sala nupcial ficou cheia de convivas. Mas, entrando o rei para ver os convivas, notou ali um homem que não trajava veste nupcial e perguntou-lhe: Amigo, como entraste aqui sem veste nupcial? Ele, porém, emudeceu. Então o rei disse aos servos: atai-o de pés e mãos e lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes. Porque muitos são chamados, mas poucos escolhidos.” (Mateus, XXII, 1 – 14.) O Cristianismo como o Espiritismo, representa a celebração das bodas de um grande e rico o proprietário, cujo pai não poupa trabalho, sacrifício e dinheiro para dar à festa o maior realce e dela fazendo participar o maior número possível de convivas. E para que todos se fartem, se satisfaçam e se alegrem, o senhor das bodas apresenta-lhes lauta mesa com variadas iguarias, não faltando música e discursos que exaltam o sentimento e a inteligência. 60 As iguarias representam os ensinos espirituais; assim como aquelas satisfazem e fortalecem o corpo, estes mantêm e vivificam o Espírito. A Parábola das Bodas é uma alegoria, uma comparação do que se verificava naquela época com o próprio Jesus Cristo. Os primeiros convidados foram os doutos, os ricos, os sábios, os aristocratas, os sacerdotes, porque ninguém melhor do que estes estavam em condições de participar das bodas fazer-se representar naquela festa soleníssima para a qual o Rei dos Céus sem medir nem pesar sacrifícios, havia mandado à Terra o seu Filho, de quem queria celebrar condignamente as bodas. E quem poderia melhor apreciar Jesus Cristo e participar de suas bodas, admirando a grande sabedoria do Mestre, seja na cura dos enfermos, seja nos prodigiosos fenômenos de materialização e desmaterialização por Ele operados, como a multiplicação dos pães e dos peixes, a manifestação do Tabor, a dominação dos elementos e suas sucessivas aparições depois da morte? Quem estava mais apto para compreender o Sermão do Monte, o Sermão Profético, o Sermão da Ceia, seus Ensinos, suas Parábolas, senão os doutores, os rabinos, os sacerdotes? Seriam os pescadores, os carpinteiros, os roceiros, as mulheres incultas? Infelizmente, porém, o que aconteceu ontem é o que acontece hoje: esta gente, toda ela se dá por excusada: uns porque têm de tratar do seu campo, outros do seu negócio; outros ainda há, como acontece com o sacerdócio romano e protestante, que agarram os servos encarregados do convite, ultrajam-nos, e, se os não matam, é porque temem o Código Penal, que vigora na época nova em que nos achamos Que fará o Senhor desta gente que não quer ouvir o seu chamamento, nem aquiescer aos seus reiterados convites? 61 Quem é o culpado, ou quem são os culpados de estarem, atualmente, festejando as bodas indivíduos sem competência nenhuma para a execução dessa tarefa? Quais são os responsáveis por haverem tomado lugar na mesa do banquete até pessoas sem o traje nupcial, sem a veste apropriada para tal cerimônia? Leiam a Parábola das Bodas os senhores padres, os senhores doutores, os senhores ministros, os senhores que andam transviando seus ouvintes e ledores com uma ciência sem base e uma religião toda material, sem provas, sem fatos, sem raciocínio! Digam: quem tem a culpa da decadência moral, da depressão da inteligência e do sentimento que se verifica em toda parte?! Se a Parábola das Bodas não tivesse sido proferida para as eminências religiosas e científicas do tempo de Jesus, serviria perfeitamente para as de hoje, que repudiam e combatem o Espiritismo. Entretanto, o fato é que os indoutos, os pequenos, os humildes de hoje, como os indoutos e humildes de ontem, estão levando de vencida toda essa plêiade de sábios e portentosos; e mesmo sem letras, sem representação e sem veste, auxiliados pelos poderes do Alto, estão concorrendo eficazmente para que as Bodas sejam bem festejadas e concorridas! A VESTE NUPCIAL Era costume antigo, aliás, como hoje ainda é, usar para cada ato, ou cada cerimônia, uma roupa de acordo com o ato ou a cerimônia a que se vai assistir. O preconceito de todos os tempos tem determinado o vestuário a ser usado em certas e determinadas ocasiões. É assim que não se vai a um enterro com uma roupa clara, como não se vai a um casamento com um terno de brim. 62 Aproveitando essas exigências sociais, muito preconizadas pelos escribas e fariseus, e mormente pelos doutores da Lei sacerdotes, Jesus, ao propor a parábola das Bodas, deu a entender que, para o comparecimento a essas reuniões, fazia-se mister uma túnica nupcial; e aquele que não estivesse revestido dessa roupagem, seria posto fora e lançado às trevas, onde haveria choro e ranger de dentes, naturalmente por haverem esbanjado tanto dinheiro em coisas de nenhum valor, de preferência à “túnica de núpcias”, bem assim por terem perdido o tempo em coisas inúteis, em vez de tecerem, como deviam, a túnica para comparecer às bodas. A veste de núpcias simboliza o amor, a humildade, a boa vontade em encontrar a Verdade para observá-la, ou seja, a pureza das intenções, a virgindade espiritual! O interesseiro, o mercador, o astuto, o tartufo que, embora convidado a tomar arte nas bodas está sem a túnica, não pode ali permanecer: será lançado fora, assim como será posto à margem o convidado a um casamento ou a uma cerimônia que não se traje de acordo com o ato a que vai assistir. Há bem pouco tempo, vimos, por ocasião de um júri numa cidade vizinha, o juiz convidar um jurado “para se compor” só pelo fato de acharse o mesmo com uma roupa de brim claro. O jurado foi posto fora, visto não estar revestido com a “veste de juízo”. *** Como esteja o Evangelho disseminado em todos os meios sociais (o que aliás constitui um dos sinais frisantes do “fim do mundo”), só mesmo os homens de má vontade, os orgulhosos, enfatuados e de espírito preconcebido ignoram seus deveres de humildade, para a recepção da Palavra Divina. 63 A estes não garantimos êxito feliz quando comparecerem ao Banquete de Espiritualidade, que se está realizando no mundo todo, no consórcio do Céu com a Terra, dos vivos com os mortos, para o triunfo da Imortalidade. Dar-se-á, sem dúvida, com esses turiferários do ouro e turibulários, o que disse Isaías em sua profecia: Ouvirão e de nenhum modo entenderão; verão e de nenhum modo perceberão”. Justamente o contrário auguramos a todos os que, “fazendo-se crianças”, quiserem achar a Verdade para abraçá-la, e tenham o firme propósito de o fazer, esteja ela com quem estiver e onde estiver. Tal é a lição alegórica das Bodas e da Veste de Núpcias.

 64 PARÁBOLA DA FIGUEIRA EM VEGETAÇÃO
 “Aprendei esta parábola tirada da figueira: quando os seus ramos já se acham tenros e brotam as folhas, sabeis que está próximo o Verão; assim também vós, quando virdes todas estas coisas, sabei que ele (O Filho do Homem) está próximo às portas. (Mateus, XXIV, 32-34 – Marcos, XII, 28-30 – Lucas, XXI, 29-32.) A figueira era, na Palestina, uma das árvores de mais valor. Ao lado do trigo, da cevada, do centeio, da azeitona, da amêndoa, do bálsamo e da mirra, o figo constituía um dos produtos mais importantes. Esta árvore, quando não é de ano inteiro, ao aproximar-se o Verão os brotos de suas folhas começam a aparecer, caracterizando assim a mudança de estação. Para bem assinalar o período da transformação do mundo, que precederia à sua vinda, Jesus comparou-o ao período intermediário entre a Primavera e o Verão, cujos sinais são descritos no capitulo XXIV do Evangelho de Mateus, assim como a entrada do Verão é assinalada pelos brotos da figueira. E esse Sermão Profético se tem cumprido em toda a linha! A começar pela derrocada dos templos, o mundo tem passado por todas as tribulações — peste, fome, guerras, terremotos, maremotos; dores e sofrimentos de toda a sorte! Estes brotos de folhas da “figueira mundo”, depois de transformados em bastas folhagens e em deliciosos figos, servirão para o preparo da Humanidade, a fim de, mais apta, receber as instruções do Cristo, não exteriormente, mas em espírito e verdade, gravando em sua alma esses talentos com que resgatará o seu passado e conquistará o seu futuro! Esta Parábola da Figueira é, pois, uma exortação à vigilância e à observância dos sinais dos tempos, porque o Filho do Homem virá em momento em que ninguém o espera! 65 No capítulo Sinais dos Tempos, o leitor se inteirará melhor do significado desta Parábola. 

66 PARÁBOLA DOS SERVOS BONS E MAUS
 “Quem é, pois, o despenseiro fiel e prudente, ao qual o Senhor confiará a direção de sua casa, para que em tempo devido distribua o alimento? Bem-aventurado aquele servo a quem o seu senhor, quando vier, achar assim fazendo! Em verdade vos digo que lhe confiará todos os seus bens. Mas se aquele servo disser no seu coração: Meu senhor tarda em vir, e começar a espancar os criados e as criadas, a comer, a beber e a embriagar-se, virá o senhor daquele servo no dia em que o não espera e numa hora que ele não sabe, e separa-lo-á e porá a sua parte com os infiéis. E aquele servo, que soube a vontade do senhor, e não se preparou, nem fez conforme à sua vontade, será castigado com muitos açoites; aquele, porém, que não a soube, e fez coisas que mereciam castigos, será punido com poucos açoites. A todo aquele a quem muito é dado, muito lhe será requerido; e a quem muito é confiado, mais ainda lhe será exigido!” (Mateus, XXIV, 45-51– Lucas, XII, 42-48.) Este ensino, que se constitui em verdadeiro mandamento para o “servo vigilante”, deixa transparecer bem claramente aos olhos de todos, quais são os servos bons e quais os servos maus que operam na Seara Divina. Não são os que vivem da Religião, comendo e bebendo, que se salientam como obreiros do Bem e da Verdade! Não são os que repudiam, condenam e excomungam seus semelhantes, que o Senhor escolheu para seus verdadeiros servos, mas, sim, os que são fiéis à sua Palavra e prudentes no cumprimento de seus deveres! Quem só trabalha pelo numerário, não pode interpretar o pensamento íntimo do Mestre; não pode, por isso, ser sábio, prudente e fiel. O bom servo só faz os desejos e a vontade de seu senhor; o mau servo faz o que lhe apraz. Aquele trabalha para cumprir seus deveres; este, por vil interesse e para satisfazer desejos bastardos. 67 Acresce ainda a circunstância de que os servos bons trabalham sempre, trabalham sem cessar, pois sabem que trabalhador da última hora não é o que chega por último, mas sim o que trabalha até a última hora, e não regateia esforços para que todos os bens que lhe foram concedidos sejam postos em ação, estejam em movimento para vencerem juros. O que nos foi confiado, não o foi para ser enterrado ou guardado, como aconteceu ao “talento” entregue ao mau operário, porém, sim, para ser por nós aproveitado e aproveitado pelos nossos semelhantes! Por isso, cada um responsável pelo que lhe é dado; a quem muito é dado, muito se lhe pedirá; a quem pouco é dado, pouco se lhe pedirá. Todas as parábolas de Jesus são exortações, convites, conselhos, mandamentos para a observância dos seus ensinos, mas exclusivamente dos seus ensinos, desembaraçados dos enxertos humanos e dos preceitos e mandamentos das igrejas de pedra. O Dia do Senhor é sempre Hoje, e sua Palavra está sempre guiando e ensinando aos que a Ele se chegam com boa vontade para aprenderem suas inestimáveis lições! O que disser, pois, “meu senhor tarda a vir”, não é um Homem-Espírito, mas, sim, um ser animal que ainda não pode ultrapassar as barreiras que separam o instinto da inteligência, a vida do corpo, da vida da alma, o Reino do Mundo, do Reino de Deus! Finalmente, os servos bons distinguem-se dos servos maus como se distinguem as laranjas; pela sua doçura.

 68 PARÁBOLA DAS VIRGENS PRUDENTES E DAS NÉSCIAS
 “O Reino de Deus será comparado a dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram ao encontro do noivo. Cinco dentre elas eram néscias e cinco prudentes. As néscias, tomando as suas lâmpadas não levaram azeite consigo; mas as prudentes levaram azeite em suas vasilhas, juntamente com as lâmpadas. Tardando o noivo, toscanejaram todas e adormeceram. Mas à meia noite ouviu-se um grito: Eis o noivo! Saí a seu encontro! Então se levantaram todas aquelas virgens e prepararam suas lâmpadas. E disseram as néscias às prudentes: Dai-nos do vosso azeite, porque as nossas lâmpadas estão se apagando! Porém as prudentes responderam: Talvez não haja bastante para nós e para vós. Ide antes aos que o vendem e comprai-o para vós. Enquanto foram comprá-lo, veio o noivo; e as que estavam apercebidas entraram com ele para as bodas e fechou-se a porta. Depois vieram as outras virgens e disseram: Senhor, Senhor, abre-nos a porta! Mas ele respondeu: Em verdade vos digo que não vos conheço. “Portanto, vigiai, porque não sabeis nem o dia, nem a hora.” (Mateus, XXV, 1-13.) Há virgens e virgens, porque se umas são prudentes, outras são néscias. Esta interessante parábola deixa ver bem claro que o Reino dos Céus não é um pandemônio de sábios e ignorantes, não é um ambiente onde tenham a mesma cotação os prudentes e os tolos. A instrução espiritual é indispensável, assim como o é a instrução intelectual na vida social. Os que passam a vida ociosamente, dela sugando o que tem de bom a lhes oferecer para a satisfação de deleites, os néscios, que julgam obter o Reino de Deus, sem estudo, sem esforço, sem trabalho, finalmente aqueles que não fazem provisão de conhecimentos que es aumentem a fé, estão sujeitos a verem apagadas as suas candeias, e a perderem a entrada às 69 bodas quando se virem forçados, de um momento para outro, a fazer aquisição de óleo, que representa os conhecimentos que fazem combustão em nossas almas, acendendo em nosso coração a lâmpada sagrada da Fé. A fé sem conhecimento pode ser comparada a uma 3ndeia mal provida que à meia noite não dá mais luz. Assim é a fé dogmática, misteriosa, abstrata: na ocasião das provações, das dores, dos sofrimentos, nessa metade da noite por que todos passam, essa fé é semelhante ao morrão que fumega, da torcida que já sugou a última gota de óleo. A prudência, ao contrário, manda ao homem que seja precavido, que abasteça abundantemente não só a sua candeia, mas também a maior vasilha que puder transportar, com o combustível que se converte em luz para lhe iluminar os passos, o caminho, a estrada por onde tem de seguir, e que assim possa, envolto em claridade, afrontar as trevas da noite inteira e ainda lhe sobre luz para com ela saudar os primeiros raios do Sol nascente. A prudência manda ao homem que estude, pesquise, examine, raciocine e compreenda. As virgens, tanto as da primeira condição, como as da segunda, representam a incorruptibilidade, representam todos aqueles que se conservam isentos da corrupção do mundo. Mas não é bastante resguardar-se da corrupção para se aproximar do Grande Modelo: Jesus, o Cristo. Assim como sem a candeia bem abastecida de combustível as virgens néscias não puderam ir ao encontro do noivo e entrar com ele nas bodas, assim também sem uma luz que bem esclareça e ainda uma provisão de combustível que faça luz, ninguém pode ir ao encontro do Cristo e penetrar nos umbrais da aliança espiritual, para tomar parte nas bodas, cantando hosanas ao santo nome de Deus. A necessidade é um entrave que paralisa o espírito, arrojando-o depois na mais densa escuridão. 70 Não é bastante a virgindade espiritual para a entrada criatura humana no Reino de Deus, mas é preciso que a mesma seja ligada ao conhecimento, a todo o conhecimento que nos foi dado por Jesus Cristo, nosso Mestre e Irmão Maior. Não pode haver no Céu um misto de ignorância e de santidade. Toda a santidade é cheia de sabedoria, porque é da sabedoria aliada à santidade que vem a verdadeira Fé e a conseqüente prática das boas obras. As virgens néscias, por não terem azeite, não encontraram e nem puderam receber o noivo, assim como não tomaram parte nas bodas, porque suas lâmpadas se apagaram à chegada do noivo. As virgens prudentes, ao contrário, acompanharam o noivo e com ele entraram nas bodas, porque tinham as suas lâmpadas bem acesas. A Religião não é crença abstrata. É um conjunto maravilhoso de fatos, de ensinamentos, que se unem, se completam, se harmonizam concretamente. Só os néscios não a compreendem, porque não abastecem as lâmpadas que lhes iluminariam esse Reino da Verdade, onde as bodas eternas felicitam os espíritos trabalhadores, humildes e prudentes. A necessidade, é a antítese da prudência; esta não pode existir onde impera aquela. Necessidade, ignorância, falta de tino, são os maiores entraves à elevação do Espírito para Deus. A prudência é cheia de sabedoria, de circunspeção, de consideração e de serenidade de espírito. A prudência não obra desordenadamente, mas se afirma pela temperança, pela sensatez e pela discrição. O inverso se dá com a necessidade. Envolta em trevas, debatendo-se em plena escuridade, não mede as responsabilidades, não prevê conseqüências, não arrazoa os atos que pratica. Esta parábola, como dissemos, ensina aos que aspiram o Reino dos Céus, a necessidade da instrução, do cultivo do espírito, do exercício da 71 inteligência e da razão, para a obtenção do conhecimento supremo, que nos guindará à eterna felicidade. Não basta dizer: Senhor! Senhor! Não basta proferir preces, nem pronunciar orações mais ou menos emocionantes para a porta da felicidade nos seja aberta, preciso, primeiro que tudo, “abastecer as lâmpadas e os vasos”. O mandamento não é só: amai-vos, é também: instrui-vos. A sabedoria é o óleo sagrado da instrução. Sem ela não há caminho para o Reino dos Céus, nem entrada para a “Casa de Deus”. Sendo nossa estadia na Terra um meio de instrução, seremos néscios se descurarmos desse dever para nos entregarmos a labores ou diversões fúteis que nenhum progresso espiritual nos podem proporcionar. As cinco “virgens prudentes” simbolizam os que lêem, estudam, experimentam, investigam, raciocinam, e, procurando compreender a vida, trabalhando pelo seu próprio aperfeiçoamento. As cinco “virgens néscia” são o símbolo daqueles que sabem tudo o que se passou, menos o que precisam saber: não estudam, enfastiam-se quando se lhes fala de assuntos espirituais; chegam mesmo a dizer que, enquanto estão nesta vida, dela tratarão, reservando o seu trabalho de Espírito para quando se passarem para o Outro Mundo. Geralmente, são estes que, nos momentos angustiosos, ou quando a “morte” lhes bate à porta, revestem-se de uma “fé” toda fictícia e exclamam: Senhor! Senhor! E como não podem obter o “óleo” de que fala a parábola, pensam poder adquiri-lo com os mercadores, mas ao voltarem encontram “fechada a porta” e ouvem a voz de dentro que lhes diz: “Em verdade, não vos conheço”! É preciso vigiar: procurar a verdade, onde quer que se encontre. É preciso adquirir conhecimentos, luzes internas que nos fazem ver o Senhor e nos permitem ingressar na sua morada. A Religião é Luz e Harmonia; assim se apresentou ela aos Discípulos no Cenáculo: em forma de “línguas de fogo e como um vento impetuoso que encheu toda a sala”. E para segui-la é preciso ter olhos e ouvidos. 72 A necessidade nada sabe, nada compreende, nada conhece, nada pensa. Só a prudência nos pode guiar no caminho da Vida, aproximando-nos daquele por cujos ditames conseguiremos nossa redenção espiritual.

 73 PARÁBOLAS DOS TALENTOS E DAS MINAS
 “Porque isto é também como um homem que, partindo para outro país, chamou os seus servos e lhes entregou os seus bens: a um deu cinco talentos, a outro dois e a outro um; a cada qual segundo a sua capacidade; e seguiu viagem. O que recebera cinco talentos, foi imediatamente negociar com eles e ganhou outros cinco; do mesmo modo o que recebera dois, ganhou outros dois. Mas o que tinha recebido um só, foi-se e fez uma cova no chão e escondeu o dinheiro do seu senhor. Depois de muito tempo voltou o senhor daqueles servos e ajustou contas com eles. Chegando o que recebera cinco talentos, apresentou-lhes outros cinco, dizendo: Senhor, entregaste-me cinco talentos: aqui estão outros dois que ganhei. Disse-lhe o seu senhor: Muito; bem, servo bom e fiel, já que foste fiel no pouco, confiar-te-ei o muito; entra no gozo do teu senhor. Chegou também o Que recebera dois talentos, e disse: Senhor, entregaste-me dois talentos; aqui estão outros dois que ganhei. Disse-lhe o seu senhor: Muito bem, servo bom e fiel, já que foste fiel no pouco, confiar-te-ei o muito; entra no gozo do teu senhor. E chegou por fim o que havia recebido um só talento, dizendo: Senhor, eu sei que és homem severo, que ceifas onde não semeaste e recolhes onde não joeiraste; e, atemorizado, fui esconder o teu talento na terra; aqui tens o que é teu. Porém o seu senhor respondeu: Sorvo mau e preguiçoso, sabias que ceifo onde não semeei, e que recolho onde não joeirei? Devias, então, ter entregado o meu dinheiro aos banqueiros, e, vindo eu, teria recebido o que é meu com juros! Tirai-lhe, pois, o talento e dai-o ao que tem os dez talentos; porque a todo o que tem, dar-se-lhe-á, e terá em abundância; mas ao que não tem, até o que tem serlhe-á tirado. Ao servo inútil, lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes.” (Mateus, XXV, 14-30.) 74 “Ouvindo eles isto prosseguiu Jesus e propôs uma parábola, visto estar ele perto de Jerusalém e pensaram eles que o Reino de Deus havia de manifestar-se imediatamente. Disse, pois: Certo homem ilustre foi para um país longínquo, a fim de obter para si o governo e voltar. Chamou dez servos seus, deu-lhes dez minas e disse-lhes: Negociai até eu voltar. Mas os seus concidadãos o odiavam, e enviaram após ele uma embaixada, dizendo: Não queremos que este homem nos governe. Quando ele voltou, depois de haver tomado posse do governo, mandou chamar os servos, a quem dera o dinheiro, a fim de saber como cada um havia negociado. Apresentou-se o primeiro e disse: Senhor, a tua mina rendeu dez. Respondeu-lhe o Senhor: Muito bem servo bom, porque foste fiel no mínimo, terás autoridade sobre dez cidades. Veio o segundo, dizendo: Senhor, a tua mina rendeu cinco. A este respondeu: Sê tu também sobre cinco cidades. E veio outro dizendo: Senhor, eis a tua mina que tive guardada em um lenço; pois eu tinha medo de ti, porque és homem severo, tiras o que não puseste e ceifas o que não semeaste. Respondeu-lhe: Servo mau, pela tua boca te julgarei. Sabias que sou homem severo, que tiro o que não pus e ceifo o que não semeei; por que, pois, não puseste meu dinheiro no banco? e então na minha vinda o teria exigido com juros. E disse aos que estavam presentes: Tirai-lhe a mina e dai-a ao que tem as dez. Responderam-lhe; Senhor, este já tem as dez. Declaro-vos que a todo o que tem, dar-se-lhe-á; mas o que não tem, até aquilo que tem lhe será tirado. Quanto, porém, a esses meus inimigos, que não quiseram que eu os governasse, trazei-os aqui e matai-os diante de mim.” (Lucas, XIX, 11-27.) A Parábola dos Talentos tem a mesma significação que as das Minas. Aquela narrada por Mateus, e esta por Lucas, exprimem perfeitamente os deveres que nos assistem, material, moral e espiritualmente. Todos somos filhos de Deus; o Pai das Almas reparte com todos igualmente os seus dons; a uns dá mais, a outros dá menos, sempre de 75 acordo com a capacidade de cada um. A uns dá dinheiro, a outros sabedoria, a outros dons espirituais, e, finalmente, a outros concede todas essas dádivas reunidas. De modo que um tem cinco talentos, outro dois, outro um; ou então um tem dez minas, outro cinco, outro duas. Não há privilégios nem exclusões para o Senhor; e se cada qual, cônscio do que possui e compenetrado de seus deveres agisse de acordo com os preceitos da Lei Divina, estamos certos de que ninguém teria razão de queixar-se da sorte ou de clamar contra a “má situação” em que a maioria se diz achar. Não existe um só indivíduo no mundo que não seja depositário de um talento ou de duas minas. Ainda mesmo aqueles que se julgam miseráveis e mendigam a caridade pública, se perscrutarem as suas aptidões, o que trazem oculto nos recônditos de sua alma, verão que não são tão desgraçados como se julgam. Todos, todos trazem a este mundo talentos e minas para garantir não só o estado presente, como sua situação futura, porque o mundo não é mais que uma estância onde viemos fazer aquisições, provisões para construir e abastecermos a nossa morada futura. Olhai o mendigo que passa andrajoso e sujo, procurai detê-lo por momentos, inquiri da sua vida, instigai-o a falar, pesquisai suas qualidades e seus defeitos, penetrai no recesso de seu coração e de seu cérebro; estudai-o física, moral e espiritualmente; fazei a sua psicologia, e tereis ocasião de ver nessa figura esquálida, monótona e por vezes repelente, qualidades superiores às de muitos homens que se ufanam nas praças, assim como vereis nele dons adormecidos, semelhantes às minas escondidas na terra ou ao talento atado a um lenço! E se assim acontece com o mendigo, o miserável, o andrajoso, com maior soma de razões a parábola tem aplicação aos grandes, aos poderosos, aos doutos, aos sacerdotes que justamente por se intitularem guias dos povos, são merecedores de maior soma de “açoites”. 76 Na época em que o Senhor das Minas e dos Talentos veio exigir dos servos a primeira prestação de contas, só foram considerados servos maus os que haviam recebido o mínimo de minas e de talentos, pois os que os haviam recebido em maior número prestaram boas contas. Mas se o Senhor viesse agora a nos pedir conta da nova emissão de dólares, minas, talentos que espalhou pelo mundo, é certo que aconteceria justamente o contrário, porque não vemos o trabalho nem o “negócio” dos que receberam dois, cinco, dez minas e talentos! Ainda mais, está a parecer-nos que o próprio capital, que pelos servos maus de outrora foi restituído do lenço ou desenterrado, nem este apareceria, pois a época é de “bancarrota” e de “falência fraudulenta”. De fato, há dois mil anos o Supremo Senhor enviou ao mundo seu filho dileto e representante, cuja doutrina sábia, consoladora e ungida de amor é a única capaz de salvar a Humanidade; e o que observamos por toda parte? Na esfera religiosa, como na esfera científica o dolo, a má fé, a deturpação da Verdade! O brado das guerras de 1914 a 1939, com as suas conseqüências, levou a orfandade aos lares, cidades foram devastadas e a imoralidade assentou sua cátedra em toda a parte, banindo das almas os princípios de fraternidade que o Cristo nos legou. E onde estão os subsídios e os subsidiados; os servos, os talentos e as minas legados no Evangelho às gerações? Esses servos indolentes, cheios de preconceitos e temores humanos, por haverem ocultado os substanciosos ditames que lhes foram doados, para com esse “capital” ganharem meios de se elevarem, passarão por penosa existência de expiação e de trevas até que, mais humildes, mais submissos à vontade divina, recebam novo talento, com o qual possam começar a preparar o seu bem-estar futuro. E que diremos dos tartufos, dos mercenários, dos trapaceiros, dos ladravazes que unidos um coro impediam e impedem o domínio da Lei de 77 Deus, trancando os Céus, não entrando e ainda impedindo a entrada aos que desejam conhecê-lo? Que diremos dos que, semeando o ódio e a dissensão ao alarido de sinos, de foguetes e de fanfarra, fazem doutrina pessoal, substituindo o Criador pela criatura, e disseminam a “fé dos concílios” em vez da fé nos Preceitos do Cristo?! Que diremos dos submissos, dos subservientes que, tendo idéias espíritas e estando convencidos de que o Espiritismo é a única doutrina capaz de nos iniciar no Caminho da Perfeição, ou por medo dos “maiorais”, ou por medo do ridículo, negam a sua fé, traem a sua consciência, escondem os seus sentimentos?! Não terá o Senhor direito de ordenar aos servos: conservai mortos esses suicidas, que se aniquilaram a si próprios; deixai-os no túmulo da descrença que eles próprios cavaram?! *** Todos somos filhos de Deus: o Pai reparte igualmente suas dádivas entre todos os seus filhos; faz levantar o Sol para bons e maus e descer as chuvas para justos e injustos; mas exige que essas dádivas sejam acrescentadas por todos. Os que obedecem a Seus preceitos têm o mérito de suas obras; os que desobedecem, o demérito, e são responsáveis pela falta de observância de seus sagrados deveres. O dinheiro não nos foi dado para volúpias nem a sabedoria para estufar; assim como os dons espirituais não nos foram concedidos senão para serem proveitosos à Fé, à Esperança e à Caridade. Mais servos houvesse e mais subsídios lhes fossem concedidos, ainda não bastariam para mal empregarem o seu tempo, esbanjando a fortuna que lhes fora concedida, a eles, meros depositários, e da qual terão de prestar severas contas. Tratando, pois, de dons-talentos materiais e morais e de servos dotados com este gênero de subsídio, não é preciso estendermo-nos em maiores 78 considerações. O livro do mundo está aberto e todos podem nele ler o que se passa. Encaremos agora as parábolas sob o ponto de vista espírita. Elas dirigem-se justamente àqueles que tiveram a felicidade de receber os talentos e as minas dos conhecimentos espíritas! Ora, é muito sabido que estes conhecimentos quando, bem entendidos e bem aplicados, são uma fonte perene de felicidade, e, ao contrário, quando mal entendidos e mal aplicados, são como que setas de remorsos cravadas nas consciências desviadas do bem e da verdade. Aqueles que recebem a Doutrina e ainda os dons espirituais, e os aplicam em proveito próprio e alheio, com o fim especial de tornar conhecida a Palavra de Deus, são os que receberam 2 e 5 talentos, 5 e 10 minas; à última hora do trabalho, quando chamados ao ajuste de contas, lhes será dito: “Servos bons e diligentes! Fostes fiéis no pouco, também o sereis no muito; confiar-vos-ei o muito; entrai no gozo do vosso Senhor”. Ou então: “Servo bom, porque foste fiel no pouco, terás autoridade sobre dez cidades, sobre cinco cidades, de acordo, cada um, com os talentos e as minas que recebeu.” Aqueles que recebem a Doutrina e os dons espirituais e não os observam, ou os aplicam mal, prejudicando a Causa que deviam zelar, são semelhantes aos que enterraram o talento e as minas. A estes dirá o Senhor: “Dizíeis que o Senhor é exigente e cioso, e, em vez de, ao menos, pordes o talento ou as minas a render juros num banco, os escondestes ou os esbanjastes, pois, pela vossa boca eu vos julgarei; entregai imediatamente as minas e o talento aos que têm, dez e cinco, porque a todo o que tem, dar-se-lhe-á e terá em abundância, e, ao que não tem, até o que tem ser-lhe-á tirado”.

 79 PARÁBOLA DA SEMENTE
 “O Reino de Deus é como se um homem lançasse a semente à terra, e dormisse, e se levantasse de noite e de dia e a semente germinasse e crescesse, sem ele saber como. A terra por si mesma produz frutos; primeiro a erva, depois a espiga e por último o grão cheio na espiga. Depois do fruto amadurecer, logo lhe mete a foice, porque é chegada a ceifa.” (Marcos, IV, 26-29.) A terra é um prodígio de fecundidade dela que nos vem o alimento, e, portanto, o corpo; é dela que nos vem à roupa. Tudo vem da terra; ela produz a erva, faz brotar a espiga, faz nascer e amadurecer o fruto; e, lançada a semente à terra, germina e cresce sem se saber como! É assim o Reino dos Céus; trazido a Terra pelo Grande Semeador, embora estivessem os homens alheios às coisas do Céu e presos à Terra, a Palavra de Jesus, que é a semente da árvore que dá frutos de Vida Eterna, atirada na obscuridade da Palestina, transformou-se, tornou-se um novo corpo cheio de fortaleza, deu a plântula, subterrânea mas perfeitamente organizada, cuja raiz se introduziu no coração de seus discípulos, e, fendida a terra produtiva, deixou sair a haste que vai crescendo viçosa, saudando a luz, aparecendo aos olhos de todos, com seus reflexos verdejantes da Esperança, que anuncia a produção do oxigênio espiritual indispensável à vida das almas! Com folhas já largamente abertas e flores perfumosas, mostra-se a árvore adulta e luxuriante, tal como fora previsto no Apocalipse pelo Cantor de Patmos; a árvore que serviria para a cura e vida dos Espíritos! A força secreta que produz todas as transformações orgânicas, também produz as transformações psíquicas. E de onde vem essa força, esse poder? De Deus! E, embora os homens descurem seus deveres, assim como a semente se transforma em árvore, a 80 semente do Reino de Deus se transforma em reino de Deus pela força do progresso incoercível que domina todas as coisas! Partindo do “germe”; a Palavra de Jesus ampliou-se, desenvolveu-se, e, por sua ação, fez desenvolver em seu seio, uma genealogia inteira de entes que, diferentes na forma e grandeza, vão constituindo e anunciando a todos o Reino de Deus! É assim a Semente da Parábola, que tem passado por todos os processos: germinação, crescimento, floração e frutificação, sem que a Revelação deixasse um só instante de vivificá-la com suas benéficas inspirações. A Revelação é o influxo divino que ergue e movimenta todos os seres, que os eleva aos cimos da Espiritualidade. O Reino de Deus, substituído até há pouco pelo Reino do Mundo, já está dando frutos de amor e de verdade, que permanecerão para sempre e transformarão o nosso planeta de um inferno hiante em estância feliz, onde as almas encontrarão os elementos de progresso para a sua ascensão à felicidade eterna.

 81 PARÁBOLA DA CANDEIA
 “Ninguém, depois de acender uma candeia, a cobre com um raso ou a põe debaixo de uma cama; pelo contrário, coloca-a :obre um velador, a fim de que os que entram vejam a luz. Porque não há coisa oculta que não venha a ser manifesta; nem coisa secreta que se não haja de saber e vir à luz. Vede, pois, como ouvis; porque ao que tiver, ser-lhe-á dado; e ao que não tiver, até aquilo que pensa ter, ser-lhe-á tirado.” (Lucas, VIII, 16-18.) “E continuou Jesus: Porventura vem a candeia para se pôr debaixo do módio ou debaixo da cama? Não é antes para se colocar no velador? Porque nada está oculto senão para ser manifesto; e nada foi escondido senão para ser divulgado. Se alguém tem ouvidos de ouvir, ouça. Também lhes disse: Atenta! no que ouvis. A medida de que usais, dessa usarão convosco: e ainda se vos acrescentará. Pois ao que tem, ser-lhe-á dado; e ao que não tem, até aquilo que pensa ter, ser-lhe-á tirado.” (Marcos, IV, 21-25.) A Luz é indispensável à vida material e à vida espiritual. Sem luz não há vida; a vida é luz quer na esfera física, quer na esfera psíquica. Apaguese o Sol, fonte das luzes materiais e o mundo deixará, incontinente, de existir. Esconda-se a luz da sabedoria e da Religião sob o módio da má fé ou do preconceito, e a Humanidade não dará mais um passo, ficará estatelada debatendo-se em trevas. Assim, pois, tão ridículo é acender uma candeia e colocá-la debaixo da cama, como conceber ou receber um novo conhecimento, uma verdade nova e ocultá-los aos nossos semelhantes. Acresce ainda que não é tão difícil encontrar o que se escondeu porque “não há coisa oculta que não venha a ser manifesta”. Mais hoje, mais amanhã, um vislumbre de claridade denunciará a existência da candeia 82 que está sob o leito ou sob o módio, e que desapontamento sofrerá o insensato que aí a colocou! A recomendação feita na parábola é que a luz deve ser posta no velador a fim de que todos a vejam, por ela se iluminem, ou, então, para que essa luz seja julgada de acordo com a sua claridade. “Uma árvore má não pode dar bons frutos”; e o combustível inferior não dá, pela mesma razão, boa luz. Julga-se a árvore pelos frutos e o combustível pela claridade; pela pureza da luz que dá. A luz do azeite não se compara com a do petróleo, nem esta com a do acetileno; mas todas juntas não se equiparam à eletricidade. Seja como for, é preciso que a luz esteja no velador, para se distinguir uma da outra. Dar a necessidade do velador. No sentido espiritual, que é justamente o em que Jesus falava, todos os que receberam a Luz da sua Doutrina precisam mostrá-la, não a esconderem sob o módio do interesse, nem sob o leito da hipocrisia. Quer seja fraca, média ou forte; ilumine na proporção do azeite, do petróleo, do acetileno ou da eletricidade, o mandamento é: “Que a vossa luz brilhe diante dos homens, para que, vendo as vossas boas obras (que são as irradiações dessa luz) glorifiquem o vosso Pai que está nos Céus.” Ter luz e não fazê-la iluminar, é colocá-la sob o módio; é o mesmo que não a ter; e aquele que não a tem e pensa ter, até o que parece ter ser-lhe-á tirado. Ao contrário, “aquele que tem, mais lhe será dado”, isto é, aquele que usa o que tem em proveito próprio e de seus semelhantes, mais lhe será dado. A chama de uma vela não diminui, nem se gasta o seu combustível por acender cem velas; ao passo que estando apagada é preciso que alguém a acenda para aproveitar e fazer aproveitar sua luz. Uma vela acendendo cem velas, aumenta a claridade, ao passo que, apagada, mantém as trevas. E como temos obrigação de zelar, não só por nós como pelos nossos semelhantes, incorremos em grande responsabilidade pelo uso da “medida” que fizemos; se damos um dedal 83 não podemos receber um alqueire; se uma oitava, não podemos contar com um quilo em restituição, e, se nada damos o que havemos de receber? A luz não pode permanecer sob o módio, nem debaixo da cama. A candeia, embora matéria inerte, nos ensina o que devemos fazer, para que a Palavra do Cristo permaneça em nós, possamos dar muitos frutos e sejamos seus discípulos. Assim, o fim da luz é iluminar e o do sal é conservar e dar sabor. Sendo os discípulos de Jesus luz e sal, mister se faz que ensinem, esclareçam, iluminem, ao mesmo tempo que lhes cumpre conservar no ânimo de seus ouvintes, de seus próximos, a santa doutrina do Meigo Rabino, valendo-se para isso do espírito que lhe dá o sabor moral para ingerirem esse pão da vida que verdadeiramente alimenta e sacia. Assim como a luz que não ilumina e o sal que não conserva, para nada prestam, assim, também, os que se dizem discípulos do Cristo e não cumprem os seus preceitos nem desempenham a tarefa que lhes está confiada, só servem para serem lançados fora da comunhão espiritual e serem pisados pelos homens. A candeia sob o módio não ilumina; o sal insípido não salga, não conserva, nem dá sabor.

 84 PARÁBOLA DA FIGUEIRA QUE SECOU
 “No dia seguinte, saindo eles de Betânia, teve fome. Vendo ao longe uma figueira que tinha folhas, foi ver se, porventura, acharia nela alguma coisa. Aproximando-se, nada achou senão folhas; porque ainda não era tempo de figos. Disse-lhe: Nunca jamais coma alguém fruto de ti; e seus discípulos ouviram isto.” “Quando chegava a tarde saíram da cidade. Ao passarem de manhã, viram que a figueira estava seca até a raiz. Pedra, lembrando-se, disse-lhe: Olha, Mestre, secou-se a figueira que amaldiçoaste!” (Marcos, XI, 12-14 – 19-21.) Antes de estudarmos esta passagem, uma consideração se apresenta às nossas vistas. Esta figueira não será a mesma que serviu de comparação ao Mestre para a exposição da sua Parábola, cap. XIII, 6 a 9 do Evangelho de Lucas? Cremos que sim, porque senão não haveria motivo para tão sumária execução. Se a própria Parábola da Figueira Estéril ensina a necessidade de cultivo, de concerto, de reparo, de fertilização com adubos, antes de toda e qualquer resolução decisiva, como, de momento, sem os requisitos preceituados neste ensinamento, Jesus resolveu fui minar a árvore que se achava bem enfolhada, bem “copada”? Para o leitor, insciente do sentido espiritual das Escrituras, outra dificuldade se mostra com a aparente contradição entre a narração do texto de Marcos e a de Mateus. Este diz: “No mesmo instante secou a figueira.” (Mateus XXI, 18 a 22); aquele: “Pela manhã, viram que a figueira estava seca até a raiz.” Entretanto, essa contradição é só aparente. Os antigos, quando se exprimiam sobre a duração de um fato, de uma coisa, de um fenômeno qualquer, não eram explícitos, como nós somos. Por exemplo, a palavra que traduzimos por eternidade, queria dizer um tempo incalculável, 85 indeterminado, de longa duração. A Escritura fala de meses de trinta anos em vez de meses de trinta dias. Acresce ainda a circunstância de que a hora dos hebreus abrangia, cada uma, três das nossas. (*) (*) Vide: Interpretação Sintética do Apocalipse, do mesmo autor. Para a expressão “no mesmo instante”, aplicada ao tempo em que a figueira secou, o período de cinco horas cabe perfeitamente, se compreendermos o modo enfático com que foi pronunciada, porque uma árvore, mesmo que cortada pela raiz, não secará nesse espaço de tempo. Naturalmente não era a primeira vez que Jesus e os seus discípulos viam aquela figueira. Por três anos consecutivos viram-na sem frutos, e mesmo depois de estercada ela permaneceu estéril. Do que Jesus se aproveitou para demonstrar, aos que tinham de ser seus seguidores, o poder de que se achava revestido e o alto saber que o orientava. Acode-nos uma lembrança também interessante. Diz Marcos que “a árvore não tinha senão folhas, porque não era tempo de figos.” Ora, esta figueira, forçosamente devia pertencer ao número daquelas árvores que dão fruto o ano inteiro; tanto mais que a parábola fala de cultivo e de adubo à mesma aplicados. Se considerarmos o clima daquela região, veremos que é perfeitamente admissível a nossa hipótese. A região fria está quase adstrita ao Norte, nas montanhas do Líbano. A proporção que se desce para Efraim, Manassés e Judá, a temperatura sobe, e aumenta ainda mais para os lados de Saron e nas costas do Mediterrâneo, tocando o grau tropical no Vale do Jordão e no Mar Morto. Por essas bandas é que se deveria encontrar a figueira, por ser mesmo o terreno mais fértil para plantações. A figueira, aparentemente, estaria bem situada. Por que não dava frutos? Adubos não lhe faltaram, cuidados não lhe foram regateados! Por que seria que só lhe vinham tronco, galhos e folhas? Com certeza, aquele circuito onde ela se achava era improdutivo, e improdutivo de tal modo que nem os adubos lhe venciam a esterilidade. 86 Ou então a semente era “chocha”, era de fundo estéril, tornando-se-lhe inúteis todos os cuidados. Seja como for, o ensino de Jesus é muito significativo, por haver escolhido uma árvore, a fim de melhor gravar no ânimo de seus discípulos a lição que lhes queria transmitir, bem assim às gerações que deveriam estudar nos Evangelhos a Verdade que orienta e salva. É instrutivo porque, havendo o Mestre tomado por ponto de comparação uma figueira, deixou bem claro que a lei de Deus, estendendo-se a toda a criação e sendo eterna, irrevogável, tanto tem ação sobre as árvores, os animais, como sobre as criaturas humanas. Essa lei, que rege na figueira a produção dos frutos, é a mesma que rege nos homens a produção das boas obras. Uma árvore sem frutos é uma árvore inútil, estéril, que não trabalha. Uma alma também sem virtudes é semelhante à figueira, na qual Jesus não encontra frutos. Há, portanto, frutos de árvores e frutos de almas; frutos que alimentam corpos e frutos que alimentam espíritos; todos são frutos indispensáveis à vida, tanto dos corpos, como das almas. A figueira, por não ter frutos, secou, embora bem enraizada, de tronco bem formado, de galhos bem ramificados, de copa bem enfolhada. Assim também o espírito, o homem, a mulher, e até as crianças sem bons sentimentos, sem virtudes divinas, sem ações caritativas, generosas, celestiais, estejam embora vestidos de seda, recamados de brilhantes, reluzentes de ouro, hão de forçosamente sofrer as mesmas conseqüências ocorridas à figueira que, por não dar frutos, secou ao império da Palavra de Jesus. Desta explicação resulta a necessidade de praticar-nos sempre boas ações, e, em nossos corações, fazermos provisão dos Ensinos Celestiais, para que o Verbo de Deus se traduza por generosas ações. 87 Entretanto, a Palavra de Deus não é só moral, é também sabedoria; e se analisarmos por esta face a seca da figueira, chegaremos à conclusão de que a Palavra de Jesus não era simples palavra, mas também ação. Jesus, durante a sua missão terrestre, foi sempre acompanhado de uma grande falange de Espíritos que executavam suas ordens. Quando Jesus disse à figueira: nunca jamais coma alguém fruto de ti”, alguns desses espíritos, com o poder de que dispunham, fizeram secar a figueira, assim como nós o faríamos aquecendo o seu ronco. O centurião, em cuja casa Jesus curou, à distância, um servo que estava paralítico, compreendeu bem o poder de Jesus e por certo sabia dos auxiliares que com Ele agiam, quando disse: “Eu também tenho soldados às linhas ordens, e digo a um: vai ali, e ele vai; a outro: vem cá, e ele vem; ao meu servo: faze isto, e ele o faz.” Com isso, o centurião teria feito ver a Jesus que conhecia o seu poder, a milícia que o acompanhava e os servos prontos a executarem suas ordens.

 88 PARÁ BOLA DO CEGO QUE GUIA OUTRO CEGO
 “Porventura pode um cego guiar outro cego? não cairão ambos no barranco?” (Lucas, VI, 39.) “Sabes que os fariseus ouvindo o que disseste, ficaram escandalizados? Mas ele respondeu: Toda a planta que meu Pai Celestial não plantou será arrancada pela raiz. Deixai-os, são cegos guias de cegos. Se um cego guiar outro cego, cairão ambos no barranco.” (Ma teus, XV - 12-14.) Há cegos do corpo e cegos do espírito, e se horrível é a cegueira do corpo, mil vezes pior é a do espírito. Entretanto, bem difícil, ou quase impossível é encontrar-se um cego a guiar outro cego, ao passo que, no que se refere às coisas do Espírito, vemos, por toda parte, cegos que guiam cegos! Qualquer homem, por haver freqüentado um seminário e ter envergado uma sotaina, já se julga com capacidade bastante para ser guia de cegos! Nunca se viu um cego formado no Instituto de Cegos sair à rua guiando cegos, mas vêem-se, todos os dias, cegos mil vezes mais cegos que os primeiros, saídos do “Instituto da Cegueira”, guiando a multidão de cegos que encontram o “barranco” do túmulo e nele caem juntamente com seus guias! Mas passemos à comparação: triste coisa é ver-se neste mundo um cego caminhando só, ou um cego a guiar outro cego, se tal fosse possível. Que acontece ao cego que caminha sem guia? Tropeça aqui, tomba ali, cai acolá; esbarra, fere-se, até que alma caridosa o tome pela mão e o conduza a casa! A mesma sorte está reservada aos cegos que guiam cegos; tanto uns, como outros, passam pelos mesmos tormentos. 89 Imagine-se agora um “cego de espírito” caminhando sozinho: um materialista, cego-voluntário, ao chegar ao Mundo Espiritual! Como poderá ele caminhar? Este homem não procurou estudar o Mundo Espiritual, nem sequer acreditava na Outra Vida: ignora a significação das palavras imortalidade, eternidade, Deus! Que acontecerá a este cego ao passar as barreiras do túmulo? Que acontecerá a este Espírito ao ver-se num mundo completamente estranho? Imaginemos, agora, um cego de espírito conduzindo uma multidão de cegos da mesma natureza, como acontece aos guias das religiões tarifadas! Imaginemos esses cegos sucedendo-se no mundo espiritual. Que será de todos eles? São cegos, o mundo onde entraram lhes é desconhecido! Como se arranjarão esses cegos, na sua entrada para um mundo cuja existência negaram, absortos que estavam nas miragens de um Céu de beatifica contemplação, de um Purgatório de brasas e de um Inferno de chamas! Decididamente, ninguém pode saber sem aprender, ninguém pode aprender sem estudar, assim como ninguém pode ver, sendo cego. A parábola de Jesus cabe a todos aqueles que fazem da fé um bloco de carvão e se submetem ao “magister dixit”, sem análise, sem estudo, sem exame. Um cego não pode guiar outro cego; um ignorante do mundo espiritual não pode guiar as almas que para ai se encaminham. Esta parábola, que faz alusão ao sacerdócio hebreu, pode referir-se hoje ao sacerdócio romano e protestante, assim como aos materialistas, modernos saduceus que tudo negam.

 90 PARÁBOLA DO BOM SAMARITANO “Levantando-se um doutor da Lei experimentou-o, dizendo: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? Respondeu-lhe Jesus: Que é o que está escrito na Lei? como lês tu? Respondeu ele: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de toda a tua força e de todo o teu entendimento e ao próximo como a ti mesmo. Replicou-lhe Jesus: Respondeste bem; faze isso e viverás. Ele, porém, querendo justificar-se, perguntou a Jesus: E quem é o meu próximo? Prosseguindo, Jesus disse: Um homem descia de Jerusalém a Jericó; e caiu nas mãos de salteadores que, depois de o despirem e espancarem, se retiraram, deixando-o meio morto. Por uma coincidência descia por aquele caminho um sacerdote; e quando o viu, passou de largo. Do mesmo modo também um levita, chegando ao lugar e vendo-o, passou de largo. Um samaritano, porém, que ia de viagem, aproximou-se do homem, e, vendo-o, teve compaixão dele; e chegando-se, atou-lhe as feridas, deitando nelas azeite e vinho; e pondoo sobre seu animal, levou-o para uma hospedaria e tratou-o. No dia seguinte tirou dois denários, deu-os ao hospedeiro e disse: Trata-o, e quanto gastares de mais, na volta to pagarei. Qual destes três te parece ter sido o próximo daquele que caiu nas mãos dos salteadores? Respondeu o doutor da Lei: Aquele que usou de misericórdia para com ele. Disse-lhe Jesus: Vai e faze tu o mesmo.” (Lucas, X, 25-37.) Se examinarmos atentamente a Doutrina de Jesus, veremos em todos os seus princípios a exaltação da humildade e a humilhação do orgulho. As personalidades mais impressionantes e significativas de suas parábolas são sempre os pequenos, os humildes, os repudiados pelas seitas dominantes, os excomungados pela fúria e ódio sacerdotal, os acusados pelos doutores da Lei, pelos rabinos, pelos fariseus e escribas do povo, em 91 suma, os chamados heréticos e descrentes! Todos estes são os preferidos de Jesus, e julgados mais dignos do Reino dos Céus que os potentados da sua época, que os sacerdotes ministradores da lei, que os grandes, os orgulhosos, os representantes da alta sociedade! Leiam a passagem da “mulher adúltera”, a Parábola do Publicano e do Fariseu, a do Filho Pródigo, a da Ovelha Perdida, a do Administrador Infiel, a do Rico e o lázaro; vejam o encontro de Jesus com Zaqueu, ou com Maria de Betânia, que lhe ungiu os pés; as Parábolas do Grão de Mostarda em contraposição à da frondosa Figueira Sem Frutos, e a do Tesouro Escondido em contraposição à dos tesouros terrenos e das ricas pedrarias que adornavam os sacerdotes! Esta afirmação se confirma com esta sentença do Mestre aos fariseus e doutores da lei: “Em verdade vos afirmo que as meretrizes e os pecadores vos precederão no Reino dos Céus.” E para que melhor testemunho desta verdade, que aparece aos olhos de todos os que penetram o Evangelho em espíritos, do que esta Parábola do Bom Samaritano? Os samaritanos eram considerados heréticos aos olhos dos judeus ortodoxos; por isso mesmo eram desprezados, anatematizados e perseguidos. Pois bem, esse que, segundo a afirmação dos sacerdotes, era um descrente, um condenado, foi justamente o que Jesus escolheu como figura preeminente de sua Parábola. O interessante, ainda, é que a referida parábola foi proposta a um Doutor da lei, a um judeu da alta sociedade que, para tentar o Mestre, foi inquiri-lo a respeito da vida eterna. O judeu doutor não ignorava os mandamentos, e como os podia ignorar se era doutor! Mas, com certeza, não os praticava! Conhecia a teoria, mas desconhecia a prática. O amor de toda a alma, de todo o coração, de todo o entendimento e de toda a força que o doutor Judeu conhecia, não era ainda bastante para fazê-lo cumprir seus deveres para com Deus e o próximo. 92 Amava, como amavam os fariseus, como os escribas amavam e como amam os sacerdotes atuais, os padres contemporâneos e os doutores da lei de nossos dias. Era um amor muito diferente e quiçá oposto ao que preconizou o Filho de Deus. É o amor do sacerdote, que, vendo o pobre ferido, despido e espancado, quase morto, passou de largo; é o amor do levita (padre também da Tribo de Levi), que, vendo caído, ensangüentado, nu e arquejante à beira do caminho, por onde passava, um pobre homem, também se fez ao largo; é o amor dos egoístas, o amor dos que não compreenderam ainda o que é o amor; é o amor do sectário fanático que ama a abstração mas desama a realidade! Salientando na sua Parábola essas personalidades poderosas da sua época, e cujo exemplo é fielmente imitado pelo sacerdócio atual, quis Jesus fazer ver aos que lessem o seu Evangelho que a santidade dessa gente não chega ao mínimo do Reino dos Céus, ao passo que os excomungados pelas Igrejas, que praticam o bem, se acham no caminho da vida eterna. De fato, quem é o meu próximo, se não o que necessita de meus serviços, de minha palavra, de meus cuidados, de minha proteção? Não é preciso ser cristão para se saber isto que o próprio Doutor da Lei afirmou em resposta à interpelação de Jesus: “O próximo do ferido foi aquele que usou de misericórdia para com ele.” Ao que Jesus disse, para lhe ensinar o que precisava fazer a fim de herdar a vida eterna: “Vai, e faze tu a mesma coisa.” O que equivale a dizer: Não basta, nem é preciso ser Doutor da Lei, nem sacerdote, nem fariseu, nem católico, nem protestante, nem assistir a cultos ou cumprir mandamentos desta ou daquela Igreja, para ter a vida eterna; basta ter coração, alma e cérebro, isto é, ter amor, porque o que verdadeiramente tem amor, há de auxiliar o seu próximo com tudo o que lhe for possível auxiliar: seja com dinheiro, seja moralmente ensinando os que não sabem, espiritualmente prodigalizando afetos e descerrando aos 93 olhos do próximo as cortinas da vida eterna, onde o espírito sobrevive ao corpo, onde a vida sucede à morte, onde a Palavra de Jesus triunfa dos preceitos e preconceitos sacerdotais! *** Finalmente, a Parábola do Bom Samaritano refere-se verdadeiramente a Jesus; o viajante ferido é a Humanidade saqueada de seus bens espirituais e de sua liberdade, pelos poderosos do mundo; o sacerdote e o levita significam os padres das religiões que, em vez de tratarem dos interesses da coletividade, tratam dos interesses dogmáticos e do culto de suas Igrejas; o samaritano que se aproximou e atou as feridas, deitando nelas azeite e vinho, é Jesus Cristo. O azeite é o símbolo da fé, o combustível que deve arder nessa lâmpada que dá claridade para a Vida Eterna — a sua Doutrina; o vinho é o suco da vida, é o espírito da sua Palavra; os dois denários dados ao hospedeiro para tratar do doente, são: a caridade e a sabedoria; o mais, que o “enfermeiro” gastar, resume-se na abnegação, nas vigílias, na paciência, na dedicação, cujos feitos serão todos recompensados. Enfim, o hospedeiro representa os que receberam os seus ensinos e os “denários” para cuidarem do “viajante ferido e saqueado”.

 94 PARÁBOLA DO AMIGO IMPORTUNO “Se um de vós tiverdes um amigo e fordes procurá-lo à meia-noite e lhe disserdes: Amigo, empresta-me três pães, porque um amigo meu acaba de chegar à minha casa de uma viagem, e nada tenho para lhe oferecer: e se do interior o outro lhe responder: Não me incomodes; a porta está fechada, eu e meus filhos estamos deitados, não posso levantar-me para tos dar, digo-vos: embora não se queira levantar para lhas dar, por ser seu amigo, ao menos por causa da sua importunação se levantará e lhe dará quantos pães precisar. E eu vos digo: Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á. Pois todo o que pede, recebe; o que busca, acha; e ao que bate, abrir-se-lhe-á. Qual de vós é o pai que, se o filho pedir um peixe, lhe dará em vez de um peixe uma serpente? Ou se pedir m ovo, lhe dará um escorpião? Ora se vós, sendo maus, sabeis ar boas dádivas a vossos filhos, quanto mais o vosso Pai Celestial, que dará um bom Espírito aos que lho pedirem.” (Lucas XI, 5-13.) Na Terra vê-se muita maldade, mas ao lado desta distinguem-se muitas ações nobres e generosas, principalmente entre amigos, cujos sentimentos e aptidões constituem laços de união e de simpatia. O homem pode não ser bom para com um adversário, um inimigo, um desconhecido. Mas, quando se trata de um amigo, mesmo dessa amizade que o mundo conhece, sem falar da amizade verdadeira que é coisa rara nesta Terra de enganos e aparências, quando se trata de um amigo ou de um conhecido que nos seja simpático, estamos prontos a servi-lo, seja de dia, seja de noite, seja por ser amigo, seja para não sermos importunados. De modo que, se um amigo bate à nossa porta à meia-noite para nos pedir três pães, e se temos os três pães, levantamo-nos, servimos ao amigo e voltamos para o nosso leito, para que não aconteça ficar o amigo a bater 95 por meia hora à nossa porta e a repetir por dez ou vinte vezes o pedido de três pães, perturbando o sono e a tranqüilidade de nossa família. Com esta alegoria quis mostrar-nos Jesus a necessidade da prece, embora repetidas vezes e a qualquer hora. Fez-nos ver assim que, sendo Deus todo solícito para com suas criaturas, obrará com mais presteza provendo-nos do que é bom em qualquer lugar em que estejamos e a qualquer momento em que lhe dirijamos o nosso apelo. Sendo a bondade divina infinitamente superior à bondade de qualquer de nossos amigos, se contamos com a resposta favorável destes nas nossas necessidades, claro está que, se crermos em Deus, com mais forte razão deveremos crer na sua bondade e na sua misericórdia. Jesus, para melhor exaltar a imaginação de seus discípulos e fazer-lhes compreender a ação da prece, após haver-lhes ensinado o modo de orar, julgou de bom alvitre fazer a exposição da parábola começando a comparação com os amigos e concluindo-a com os pães. “Qual e o pai, perguntou o Mestre, capaz de dar uma serpente ao filho que lhe pede um peixe? Qual é o pai capaz de dar um escorpião ao filho que lhe pede um ovo?” E acrescentou: “Se vós, sendo maus, sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais o vosso Pai celestial, que dará um bom Espírito aos que lho pedirem.” Já no tempo de Jesus, mesmo entre seus discípulos, a superstição do Diabo, não raro sufocava a predominância que os Espíritos bons tinham, mormente quando chamados para um ato de caridade ou de ciência. Os fariseus, como acontece com os sacerdotes de hoje, diziam que todos os fatos extraordinários que a ação de Jesus causava, eram oriundos de Belzebu, príncipe dos demônios, tal como se pode verificar nos versos subseqüentes do capítulo que estamos estudando. Os discípulos, como dissemos, também se achavam impregnados dessa crença blasfema, que haviam herdado de seus pais carnais. 96 Jesus que veio à Terra para anunciar a Palavra do Deus de amor não podia deixar de combater o erro em que se achavam aqueles que mais tarde teriam de ministrar aos homens a sua Doutrina de Perdão e de Caridade. A parábola do amigo importuno é, pois, a excelente parábola em que o Espírito bom tem a sua primazia. É claro que, se o nosso pai é incapaz de nos dar uma serpente quando lhe pedimos um peixe, Deus, que é nosso Pai Espiritual, não nos pode dar um Espírito ignorante, atrasado, quando lhe pedimos um Espírito bom.

 97 PARÁBOLA DO AVARENTO
 “As terras de um homem rico produziram muito fruto. E ele discorria consigo: Que hei de fazer, pois não tenho onde recolher os meus frutos? E disse: farei isto: derribarei os meus celeiros e os construirei maiores, e aí guardarei toda a colheita e os meus bens e direi à minha alma: Minha alma, tens muitos bens em depósito para largos anos; descansa, come e bebe e regala-te. Mas Deus disse-lhe: Insensato, esta noite te exigirão a tua alma; e as coisas que ajuntaste para quem serão? Assim é aquele que entesoura para si e não é rico para com Deus.” (Lucas, XII, 16-21.) Quanto mais se avizinhava o tempo do cumprimento da Missão do Divino Messias, mais Ele intensificava o seu trabalho de difusão da Doutrina de que havia sido encarregado, pelo Supremo Senhor, de trazer à Terra. Os escribas e fariseus já faziam planos sinistros para acabar com a vida do Filho do Homem, quando o Mestre Excelente iniciou a exposição das imaginosas parábolas que constituem um dos mais eloqüentes capítulos do Novo Testamento. A Parábola do Avarento é uma síntese maravilhosa do trágico fim de todos aqueles que não vêem a felicidade senão no dinheiro e se constituem em seus escravos incondicionais. Para essa gente, havendo dinheiro, há tudo. Periclite a família, cambaleie a sociedade, arraste-se o mendigo pelas vias públicas envergonhado e descomposto, chore e soluce o aflito, grite de dores o enfermo miserável ou o inválido sem pão e sem lar, nada comove esses corações de pedra, nada lhes demove, nada consegue mudar-lhes ou desviar-lhes as vistas dos “seus frutos”, dos seus celeiros, do seu ouro! 98 São homens desumanos, sem alma; pelo menos ignoram a existência, em si mesmos, desse princípio imortal que deve constituir, para todos, o principal objeto de cuidados e de carinho. A avareza é a véspera da mendicidade, ou seja, o fator da miséria. Quantos miseráveis perambulam pelas praças, implorando o óbulo e que, mesmo nesta existência, foram ricos, sustentaram grandezas, bastos celeiros transbordantes! Quantos párias se arrastam pelas ruas, a bater de porta em porta, implorando “uma esmola pelo amor de Deus!” Qual a origem dessa situação penosa que atravessam, qual a causa desses sofrimentos? A avareza! Ricos dinheiro, eram pobres para com Deus, porque, embora não lhes faltasse tempo, nunca se dedicaram a Deus, nunca procuraram a sua lei, nunca pesquisaram o próprio íntimo em busca de algo que existe, que sente, que quer e não quer, que ama e que odeia, que vê o passado, que ao menos, teme o futuro; nunca buscaram saber se essa centelha de inteligência que lhes dá tanto amor ao ouro, tanta ganância pelos lucros terrenos poderá, quiçá, sobreviver a esse corpo que, de uma hora para outra, cairá exânime, para ser entregue ao banquete dos vermes! O que valem riquezas efêmeras, sombras de felicidade que se esvaem, fumo de grandezas que desaparecem à primeira visita de uma enfermidade mortal! O que valem celeiros repletos em presença do “ladrão da morte”, que chega em momento inesperado, e, até, quando nos julgamos em plena mocidade e com ótima saúde! Míseros avarentos dos bens que Deus vos confiou! Pensais, porventura, que não tereis de prestar ao Senhor severas contas desse depósito? Pensa que eles hão de permanecer conosco e servirão para multiplicar cada vez mais a vossa fortuna? Em verdade vos afirmo que vosso ouro se converterá em brasas a causticar vossa consciência! Em verdade vos digo que ele se transformará em peias e algemas, resultantes da ação nefasta que exercestes em detrimento dos que tinham fome, dos 99 que tinham sede, dos enfermos desprezados, dos pobres trabalhadores de quem explorastes o trabalho! Ricos! Movimentai esse talento que o Senhor vos concedeu! Granjeai amigos com esse tesouro da iniqüidade, para que eles vos auxiliem a entrar nos tabernáculos eternos! Fazei o bem; socorrei o pobre; amparai o órfão; auxiliai a viúva necessitada; curai o enfermo, como se ele fosse vosso irmão ou vosso filho; pagai com generosidade o trabalhador que está ao vosso serviço! Fazei mais: comprai livros e aproveitai os momentos de ócio para vos instruir, por que um rico ignorante é tanto como um asno de sela dourada! Ilustrai o vosso Espírito; fazei para vós, tesouros e celeiros nos Céus, onde os vermes não chegam, os ladrões não alcançam, a morte não entra! Lembrai-vos da Parábola do Avarento, cuja alma, na mesma noite em que fazia castelos no ar, foi chamada pelo Senhor!

 100 PARÁBOLA DO SERVO VIGILANTE “Estejam cingidas as vossas cintas e acesas as vossas candeias; e sê de vós semelhantes a homens que esperam pelo seu senhor, ao voltar ele das bodas; para que, quando vier e bater à porta, logo lha abram. Bemaventurados aqueles servos! a quem o senhor achar vigiando, quando vier; em verdade vos digo que ele se cingirá, os fará sentar à mesa, e, chegandose, os servirá. E quer ele venha na segunda vigília, quer na terceira, bemaventurados serão eles, se assim os achar. Mas sabei que, se o dono da casa tivesse sabido a hora a que havia de vir o ladrão, não haveria deixado arrombar a sua casa. Estai, vós, também apercebidos, porque à hora que não pensais, virá o Filho do Homem.” (Lucas, XII, 35-40.) Na esfera espiritual, como na material, a qualidade indispensável do servo é ser vigilante. Servo vigilante é o que trata com zelo dos misteres que lhe são afetos, correspondendo, como deve, ao salário pelo qual se ajustou, e satisfazendo, ao mesmo tempo, as ordens que recebe de seu senhor. A dissídia no trabalho, não só abate o crédito do operário, como também lesa os interesses de seus superiores. O bom servo, que trabalha nas coisas referentes ao Espírito, não tem tempo para se reclinar no leito e, de candeia apagada, dormir o bom sono, esquecendo os trabalhos que lhe são afetos. Precisa ele, com a cinta cingida e a candeia acesa, vigilante, aguardar que o Senhor lhe bata à porta. Nenhum dos servos sabe em que vigília chegará o Senhor, se na segunda, se na terceira; e a vinda do Senhor é tão certa, como a descida das chuvas à terra, como a mudança do dia pela noite, como o calor, como 101 o frio, como os ventos, como a volta dos cometas, como o brilho das estrelas. Em linguagem evangélica, servo vigilante é o que estuda, é o que pesquisa, perquire, e, de candeia acesa, isto é, com o entendimento aclarado pela compreensão dos fatos que observou e dos estudos que fez, ilumina os que lhe estão próximos, ensinando-lhes o caminho que vai ter a Deus, que não pode ser outro que o da caridade, bem compreendida, como ensina o Espiritismo!

 102 PARÁBOLA DOS PRIMEIROS LUGARES
 “Ao anotar como os convidados escolhiam os primeiros lugares, propôs-lhes esta parábola: Quando fores por alguém convidado para um casamento, não te sentes no primeiro lugar; para não suceder que seja por ele convidada uma pessoa mais considerada do que tu e; vindo o que te convidou a ti e a ele, te diga: Dá o lugar a este; e então irás envergonhado ocupar o último lugar. Pelo contrário, quando fores convidado, vai tomar o ultimo lugar, para que, quando vier o que te convidou, te diga: Amigo, senta-te mais para cima; então isto será para ti uma honra diante de todos os mais convivas. Pois todo o que se exalta, será humilhado; mas todo o que se humilha, será exaltado.” (Lucas, XIV, 7-11.) É costume dos orgulhosos, que querem ostentar grandeza, ocupar na sociedade as posições mais distintas; tornarem-se salientes, para atrair atenções. Jesus, que costumava freqüentar certas reuniões em ocasiões que julgava próprias, para estudar o caráter e a psicologia das gentes, antes de propor a seus discípulos a Parábola da Grande Ceia, julgou de bom aviso ensinar-lhes que, mesmo como convivas desse “banquete espiritual”, não deveriam pleitear os primeiros lugares, posições inadequadas aos que devem observar estritamente a humildade, único meio de exaltação e de conquista de mérito. Nenhum valor tem para Jesus os que se salientam pomposamente nos primeiros lugares e praticam todas as obras que aparentemente são boas, para serem visto pelos homens; os que alargam seus filactérios, alongam suas fímbrias, e gostam do primeiro lugar nos banquetes, das primeiras cadeiras nas sinagogas, das saudações nas praças públicas e de serem chamados mestres. 103 O conviva da “grande ceia” deve ser sóbrio, modesto, prudente, recatado, cheio de boa vontade, laborioso, e, em vez de se recostar comodamente no primeiro lugar que encontra vago em torno da mesa do banquete, deve fazer-se como o servo que, depois de bem examinar as iguarias, serve eqüitativamente aos convivas, segundo o paladar de cada um deles. “A cadeira de Moisés”, o estudante do Evangelho já o sabe, não deve ser ocupada pelos novos convivas da “grande ceia”, para que lhes não seja aplicado o libelo condenatório pronunciado pelo Mestre contra os escribas e fariseus. (Mateus, XXIII.) A sentença do Mestre “O que se exalta, será humilhado; mas o que se humilha, será exaltado”, tem estrita aplicação a todos os que já receberam a Palavra de Jesus em espírito e verdade. Na Parábola do Bom Servo está escrita a obrigação dos que desejam os “primeiros lugares espirituais”. Não é por ocupar os “primeiros lugares na sociedade” que os obteremos. Ninguém pense galgar as eminências da glória, sem haver prestado seus serviços à causa da Verdade, sem ter experimentado, para tal fim, provas difíceis de vencer, sem haver triunfado nas lutas, sem ter vencido o mundo com suas enganadoras miragens. Os primeiros lugares espirituais não são aqueles em que somos honrados, mas aqueles em que nos colocamos para honrar; não são aqueles em que somos servidos, mas os em que nos dão ensejo de servir. “O Filho do Homem não veio ao mundo para ser servido, mas para servir.” A Parábola de Jotam, pronunciada no crime de Gerizim, para exortar o povo de Shechem, pode ser repetida hoje aos que conquistam as glórias e querem naturalmente obter aquelas que não passam como a flor da erva:

 104 AS ÁRVORES QUE ESCOLHEM UM REI
 (Tradução Livre) Certa vez as árvores deliberaram escolher um rei. Uniram suas vozes e disseram à oliveira: reina sobre nós. A oliveira respondeu: deixarei, porventura, a minha gordura, que se usa para honrar aos deuses e aos homens, para reinar sobre árvores? Voltaram-se as árvores para a figueira e lhe disseram: Vem, então, tu, e reina sobre nós. Mas a figueira respondeu: Deixarei, porventura, a minha doçura e as demais qualidades que possuo para reinar sobre árvores? Em vista da recusa, as árvores se congregaram em torno da videira e disseram-lhe: Vem tu, e reina sobre nós. A videira também se escusou, dizendo: hei de deixar o meu suco que alegra aos deuses e aos homens, para dominar sobre árvores? Então as árvores voltaram-se para o espinheiro e lhe disseram: Vem tu e reina sobre nós. Ao que o espinheiro respondeu: Se vós, na verdade, me ungis vosso rei, vinde e refugiai-vos debaixo da minha sombra; mas; se não, do espinheiro sairá fogo que devorará os cedros do Líbano. *** Este apólogo, que encerra profundos ensinamentos sob o véu da letra, deixa ver bem claro que os nossos deveres espirituais para com os homens, e para com Deus, não devem ser substituídos por qualquer oferta que nos façam, embora elas aparentem fins de interesse público ou pareçam visar glórias espirituais.

 105 PARÁBOLA DA GRANDE CEIA
 “Um homem deu uma grande ceia, e convidou a muitos; e à hora da ceia enviou o seu servo para dizer aos convidados: Vinde, porque tudo já está preparado. Começaram todos à uma a escusar-se. Comprei um campo, disse um, e preciso ir vê-la; rogo-te que me dês por escusado. Comprei cinco juntas de bois, disse outro, e vou experimentá-las; rogo-te que me dês por escusado. Casei-me, disse outro ainda, e por isso não posso ir. O servo voltou e contou isto ao seu senhor. Então, irado, o dono da casa disse ao seu servo: Sai depressa para as ruas e becos da cidade e traze para aqui os pobres, os aleijado, os cegos e os coxos. Disse o servo: Senhor, feito está o que ordenaste e ainda há lugar. Respondeu-lhe o senhor: Sai pelos caminhos e atalhos e obriga a todos a entrar, para que se encha a minha casa; porque vos declaro que nenhum daqueles homens que foram convidados, provará a minha ceia”. (Lucas, XIV, 16-24.) O apego ao mundo e as coisas do mundo, priva o homem das bênçãos de Deus. Certa vez, encontrando Jesus um moço de qualidade e rico, que observava todos os mandamentos, mas não observava o principal dos mandamentos que se constitui no desapego às coisas do mundo, disse: “É mais fácil um camelo passar pelo fundo duma agulha, do que um rico salvar-se”. O homem superior, o Espírito evoluído, jamais prefere os bens da Terra em detrimento dos bens do Céu, porque sabe que aqueles se extinguem e estes permanecem para sempre. Não há campo, não há bois, não há casamento, capazes de desviar o homem de bem dos seus deveres espirituais. 106 Ele sabe atender com solicitude a todos os apelos do Alto, embora se arruínem os campos, fiquem os bois sem serem experimentados e se transfira o casamento. O contrário se dá com o homem do mundo: preso aos negócios, às diversões, à ganância louca, esquecem-se de seus deveres para com Deus, de seus deveres para com seu próximo, de seus deveres para consigo mesmo, isto é, dos deveres espirituais que tem de realizar no mundo. Nesta parábola Jesus faz alusão às suas próprias prédicas, que se constituem no banquete espiritual; a diversidade de ensinos sistematizando a bela e excelente Doutrina Cristã, são os “pratos” variados da grande mesa em que todos podem fartar-se, para não mais sentir aquela fome de saber. Os convidados foram os grandes, os potentados, os afazendados, que se negaram a ouvir a Palavra do Reino de Deus, que não quiseram comparecer a esse banquete celestial. São estes os excluídos das bênçãos do Céu, porque as recusaram, preferindo os deleites do mundo. Os pobres, coxos, aleijados e cegos são os que não têm campos, não têm bois para experimentar, nem casamento para privá-lo do comparecimento à ceia. São os deserdados das mundanas glórias, das mundanas pompas, dos bens mundanos e os que consideram os chamados do Céu superiores aos chamados da Terra. De fato, a Palavra de Jesus exclui todas as honras, etiquetas e preconceitos terrenos! Para nos chegarmos a Ele precisamos nos comparar a uma criança que não tem idéias preconcebidas, que não tem campos, bois, casamentos, porque a palavra de Jesus é superior a tudo e requer de nós o máximo respeito, a máxima consideração, o maior acatamento! E essa palavra não passou! A mesa continua cheia de manjares de várias qualidades, capazes de satisfazer os mais exigentes paladares, assim como os grandes do mundo, os proprietários de campos e de bois continuam recusando-se a comparecer a tão atencioso convite. 107 A Parábola é a figura do que acontecia na época do nascimento do Cristianismo, e é a figura do que acontece nos nossos tempos: os “graúdos” deste mundo não querem responder ao apelo que se lhes faz, por isso os pequenos e deserdados enchem a mesa, embora, como disse o servo encarregado do convite: “ainda há lugar para os que quiserem comparecer”. O Cristianismo, em seu complemento espírita, realiza novamente esse chamado, e estamos certos de que todas as ovelhas que constituirão o único rebanho do Supremo Pastor ouvirão os incessantes chamados que lhes estão sendo feitos, e corresponderão, com solicitude e boa vontade, aos divinos convites que partem de todos os recantos do mundo.

 108 PARÁBOLA DA DRACMA PERDIDA “Qual é a mulher que tendo dez dracmas e perdendo uma, não acende a candeia, não varre a casa e não a procura diligentemente até achá-la? Quando a tiver achado, reúne as suas amigas e vizinhas, dizendo: Regozijai-vos comigo, porque achei a dracma que tinha perdido! Assim, digo-vos, há júbilo na presença dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende.” (Lucas, XV, 8-10.) O principal escopo de Jesus, durante toda a sua existência na Terra, foi demonstrar aos homens a Imortalidade da Alma, a Vida Eterna, a bondade, a misericórdia, a solicitude desse Deus, que Ele anunciava, para com todas as suas criaturas. Nunca o Mestre exigiu de seus discípulos holocaustos e sacrifícios. O que Ele queria é que o amassem, que cressem na sua Palavra e confiassem no Pai, que ele tinha vindo anunciar, Pai criador e zelador de toda a sua criação, de todas as suas obras; que veste os lírios e as açucenas, e alimenta os passarinhos; que procura a ovelha perdida; que recebe o filho pródigo, e que sente grande contentamento quando um de seus filhos para Ele se volta e lhe solicita os benefícios de que necessita para sua ascensão espiritual! Para bem gravar os Seus ensinos na imaginação de seus ouvintes, o Mestre amoroso, sempre que se lhe oferecia ocasião, fazia comparações servindo-se de ocorrências que se verificavam todos os dias, exaltando assim os impecáveis atributos de Deus. A Parábola da Dracma Perdida, que não passa de um simples episódio, em que Jesus reuniu às exortações que fez certa vez aos publicanos e pecadores, compara Ele a alegria que há no Mundo Espiritual, na presença 109 dos Mentores, quando um pecador se arrepende, com a alegria que tem uma mulher ao achar 315 réis (uma dracma) (*), que havia perdido! (*) Modernamente, a dracma é a unidade monetária da Grécia, dividida em 100 Kepta e cotada a 30 por dólar (1968) E faz ver que, pela mesma forma que a mulher, ao perder a dracma, acende a candeia, varre a casa e procura-a diligentemente até achá-la, também Deus emprega todos os meios que sabiamente sugere aos Espíritos seus Mensageiros para encontrar a sua dracma, ou seja o pecador que se perdeu, a fim de ser ele restituído à casa paterna. O Deus de Jesus, como se vê, é o Deus sábio e benevolente, o Deus amoroso e caritativo, e não o “Deus” pródigo, cioso, vingativo e mau, ensinado pelas religiões humanas, pelos sacerdotes. É isto que quer a parábola: exaltar a bondade e o amor de Deus, que em nós desperta princípios de sabedoria, para nos aproximarmos do Supremo Senhor.

 110 PARÁBOLA DO FILHO PRÓDIGO “Um homem tinha dois filhos. Disse o mais moço a seu pai: Meu pai, dá-me a parte dos bens que me toca. E ele repartiu os seus haveres entre ambos. Poucos dias depois o filho mais moço ajuntando tudo o que era seu, partiu para um país longínquo e lá dissipou todos os seus bens, vivendo dissolutamente. Depois de ter consumido tudo, sobreveio àquele pais uma grande fome e ele começou a passar necessidades. Então foi encostar-se a um dos cidadãos daquele pais e este o mandou para seus campos a guardar porcos; ali desejava ele fartar-se das alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. Caindo, porém, em si, disse: Quantos jornaleiros de meu pai têm pão com fartura e eu aqui, morrendo de fome! Levantar-me-ei, irei a meu pai e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o Céu e diante de ti; já não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus jornaleiros. E levantando-se foi a seu pai. Estando ele ainda longe, seu pai viu-o e teve compaixão dele, e; correndo, o abraçou e o beijou. Disse-lhe o filho: Pai, pequei contra o Céu e diante de ti; já não sou digno de ser chamado teu filho. O pai, porém, disse aos seus servos: trazei depressa a melhor roupa e vesti-lha, e ponde-lhe o anel no dedo e sandálias nos pés; trazei também um novilho cevado, matai-o, comamos e regozijemo-nos, porque este meu filho era morto e reviveu, estava perdido e se achou. E começaram a regozijar-se. Ora, o seu filho mais velho estava no campo; e, quando voltou e foi chegando à casa, ouviu a música e a dança, e chamando os criados perguntou-lhes o que era aquilo. Um deles respondeu: Chegou teu irmão e teu pai mandou matar o novilho cevado, porque o recuperou com saúde. Então ele se indignou, e não queria entrar; e, sabendo disso, seu pai procurava conciliá-lo. Mas ele respondeu: Há tantos anos que te sirvo, sem jamais transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para eu me regozijar com os meus amigos; mas, quando veio este teu filho que gastou teus bens com meretrizes, tu 111 mandaste matar o novilho mais gordo. Respondeu-lhe o pai: Filho, tu sempre estás comigo, e tudo que é meu é teu; entretanto, cumpria regozijarmo-nos e alegrarmo-nos, por que este teu irmão era morto e reviveu, estava perdido e se achou.” (Lucas, XV, 11-32.) Esta Parábola imaginosa relatada pelo Evangelista Lucas é a doce e melodiosa Palavra de Jesus, dizendo aos homens da bondade sem limites, da caridade infinita de Deus! Ambas as individualidades que representam o Filho Obediente e o Filho Desobediente simbolizam a Humanidade Terrestre. O Pai de ambos aqueles filhos, simboliza Deus. Uma pequena, pequeníssima parte da Humanidade personificada no Filho Obediente, se esforça por guardar a Lei Divina e permanece, portanto, na Casa do Pai. A outra parte personifica o Filho Desobediente, que, de posse dos haveres celestiais, dissipa todos esses bens e vive dissolutamente, até chegar ao extremo de ter de comer das alfarrobas que os porcos comem. Esse extremo é que o força a voltar à casa paterna, onde, acolhido com benemerência e conforto, volta a participar das regalias concedidas aos outros filhos. Em resumo: esta simples alegoria, capaz de ser compreendida por uma criança, demonstra o amparo e a proteção que Deus sempre reserva a todos os seus filhos. Nenhum deles é abandonado pelo Pai Celestial, tenha os pecados que tiver, pratique as faltas que praticar, porque se é verdade que o filho chega a perder a condição de filho, o Pai nunca perde a condição de Pai para com todos, porque todos somos criaturas suas. Estejam eles onde estiverem, quer no Mundo, quer no Espaço; quer neste planeta, quer em país longínquo, ou seja noutro planeta, com um corpo de carne ou com um corpo espiritual, o Pai a nenhum despreza, a nenhum abandona, porque nos criou para gozarmos da sua Luz, da sua Glória, do seu Amor! 112 O Pai Celestial não é o pai da carne e do sangue, pois como disse o Apóstolo: “a carne e o sangue não podem herdar o Reino de Deus”; a carne e o sangue são corruptíveis, só o Espírito é incorruptível, só o Espírito permanece eternamente. O Pai Celestial é Espírito, é Deus de Verdade, Deus Vivo, por isso seus filhos também são Espíritos que permanecem na Imortalidade. A Luz, a Verdade, o Amor não foram criados para os corpos, mas sim para as almas. Como poderia Deus criar um “filho pródigo”, a não ser para que ele, depois de passar pela experiência dura do mal que praticou, voltar para o seu Criador, e, arrependido, propor o não mais ser perdulário, mas adaptar-se à Vontade Divina, e caminhar para os destinos felizes que lhe estão reservados! Como poderia Deus criar uma alma ao lado de um Inferno Eterno! Que pai é esse que produz filhos para mandá-los atormentar para sempre? A Parábola do Filho Pródigo é a magnificência de Deus e ao mesmo tempo o solene e categórico protesto de Jesus contra a doutrina blasfema, caduca, irracional das penas eternas do Inferno, inventada pelos homens. Não há sofrimentos eternos, não há dores infindáveis, não há castigos sem fim, porque se os mesmos fossem eternos, Deus não seria justo, sábio e misericordioso. Há gozos eternos, há prazeres inextinguíveis, há felicidades indestrutíveis por todo o infinito, esplendores por toda a Criação, Amor por toda a Eternidade! Erguei as vossas vistas para os céus. O que vedes? Um manto estrelado sobre vossas cabeças, chispas luminosas vos cercam de carícias; fulgurações multicores vos atraem para as regiões da felicidade e da luz! Olhai para baixo, para a terra, para as águas: o que vedes? Essas chispas, essas luzes, essas estrelas, essas cintilações retratadas no espelho das águas, nas carolas das flores, nos tapetes verdejantes dos campos; 113 porque das luzes nascem as cores, são elas que dão colorido às flores, que iluminam os campos, que agitam as águas! Ó! homem, onde quer que estejas, se quiseres ver com os olhos do Espírito, verás a bondade e o amor de Deus animando e vivificando o Universo inteiro! Tanto em baixo como em cima, à esquerda como à direita, se abrires os olhos da razão, verás a mesma lei sábia, justa, eqüitativa, regendo o grão de areia e o gigantesco Sol que se baloiça no Espaço; o infusório que emerge, a gota d’água e o Espírito de Luz, que se eleva sereno às regiões bem-aventuradas da Paz! A Lei de Deus é igual para todos: não poderia ser boa para o bom e má para o mau; porque tanto o que é bom quanto o que é mau estão sob as vistas do Supremo Criador, que faz do mau bom, e do bom melhor: pois tudo é criado para glorificar o seu Imaculado Nome! Não há privilégios nem exclusões para Deus; para todos Ele faz nascer o seu Sol, para todos faz brilhar suas estrelas, para todos deu o dia e a noite; para todos faz descer a chuva! *** Quando a criatura humana, num momento de irreflexão se afasta de Deus, e, dissipando os bens que o Criador a todos doou, se entrega a toda sorte de dissoluções, a dor e a miséria, esses terríveis aguilhões do Progresso Espiritual ferem rijo a sua alma orgulhosa até que, num momento supremo de angústia, ela possa elevar-se para Deus e deliberar reentrar no caminho da perfectibilidade. É então que, como o Filho Pródigo, o homem transviado, tocado pelo arrependimento, volta-se para o Pai carinhoso e diz: “Pai, pequei contra o Céu e contra ti; já não sou digno de ser chamado teu filho...” E Deus, nosso amoroso Criador, que já o havia visto em caminho para dEle se aproximar e rogar, abre àquele filho as portas da regeneração e lhe faculta todas as dádivas, todos os dons necessários para esse grandioso trabalho da perfeição espiritual. 114 Está escrito no Evangelho que houve um banquete com música e festa à chegada do Filho Pródigo à Casa Paterna. Está escrito mais, que o Pai mandou ver a melhor roupa para vestir o filho que voltou, as melhores sandálias para lhes resguardar os pés e, ainda lhe colocou no dedo um belo anel, tal foi a alegria que teve, e tal é a alegria nos Céus, quando uma alma transviada, para os Céus se volta. O Pai está sempre pronto a receber o Filho Pródigo, e os Céus estão sempre abertos à sua chegada Não há falta, por maior que seja, que não se possa reparar; assim como não há nódoa, por mais fixa que pareça, que não se possa apagar. Tudo se retempera, tudo se corrige, tudo se transforma, do pequeno para o grande, do mau para o bom, das trevas para a luz, do erro para a verdade! Tudo limpa, tudo alveja, tudo reluz ao atrito do fogo sagrado do Progresso, tudo se aperfeiçoa, tudo evolui, todas as almas caminham para Deus! Eis o que diz o Evangelho, mas o Evangelho de Jesus Cristo, o Evangelho do Amor a Deus e ao próximo. Completando a Parábola, vemos que o Filho Pródigo recebeu os bens, saiu de casa, esbanjou-os dissolutamente numa vida desregrada. E o que não foi Pródigo, o Filho Obediente, por seu turno, enterrou seus bens, como aquele que enterrou o talento da Parábola. O que diz o Evangelho que o Filho Obediente fez dos bens que possuía? Ele vivia à custa do Pai, participava de todos os bens que havia em casa, e, com a chegada do irmão, ao ver a festa com que aquele foi recebido, entristeceu-se: cheio de egoísmo, de avareza, revoltou-se contra o Pai! Infelizmente, é assim esta atrasada Humanidade! Ela se compõe de Filhos Pródigos e de Filhos Obedientes, mas estes parecem ser ainda piores que aqueles! 115 E tanto é verdade o que nos passa pela mente, que, ao concluir a Parábola, o Mestre exalta os pródigos que voltam e censura os obedientes que ficam, não só com os bens que receberam, como, também, com as paixões más de que não se querem despojar! Mas a Humanidade progride, e este mundo passará a hierarquia mais elevada com a vinda de Espíritos melhores, que nos orientarão para o Bem e o Belo, para a realização total dos nossos destinos!

 116 PARÁBOLA DO ADMINISTRADOR INFIEL
 “Disse Jesus aos discípulos: Havia um homem rico, que tinha um administrador; e este lhe foi denunciado como esbanjador dos seus bens. Chamou-o e perguntou-lhe: que é isto que ouço dizer de ti? Dá conta da tua administração; pois já não podes mais ser meu administrador. Disse o administrador consigo: Que hei de fazer, já que o meu amo me tira a administração? Não tenho forças para cavar; de mendigar tenho vergonha. Eu sei o que hei de fazer para que, quando for despedido do meu emprego, me recebam em suas casas. Tendo chamado cada um dos devedores do seu amo, perguntou ao primeiro: Quanto deves ao meu amo? Respondeu ele: Cem cados de azeite. Disse-lhe então: Toma a tua conta, senta-te depressa e escreve cinqüenta. Depois perguntou a outro: E tu, quanto deves? Respondeu ele: Cem coros de trigo. Disse-lhe: Toma a tua conta e escreve oitenta. E o amo louvou o administrador iníquo, por haver procedido sabiamente; porque os filhos deste mundo são mais sábios para com a sua geração do que os filhos da luz. E eu vos digo: Granjeai amigos com as riquezas da iniqüidade, para que, quando estas vos faltarem, vos recebam eles nos tabernáculos eternos. Quem é fiel no pouco, também é fiel no muito; e quem é injusto no pouco, também é injusto no muito. Se, pois, não fostes fiéis nas riquezas injustas, quem vos confiará as verdadeiras? E se não fostes fiéis no alheio, quem vos dará o que é vosso? Nenhum servo pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer a um e amar a outro, ou há de unir-se a um e desprezar ao outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas.” (Lucas, XVI, 1-13.) O sentido oculto desta parábola visa a estas duas qualidades, pelas quais se reconhece a bondade ou a maldade do homem: fidelidade e infidelidade. 117 Fidelidade é a constância, a firmeza e a lealdade com que agimos em todos os momentos da vida: na abastança como na pobreza, nas eminências dos palácios como na humildade das choupanas, na saúde como na enfermidade, e até nos umbrais da morte como no apogeu da vida. O Apóstolo Paulo, demonstrando sua lealdade, sua constância, sua fidelidade, sua firmeza de caráter, dizia: “Quem me separará do amor de Cristo?” A fidelidade é a pedra de toque com que se prova o grau do caráter do homem. É fiel nos seus deveres? Tem forçosamente todas as qualidades exigidas ao homem de caráter: reconhecimento, gratidão, indulgência, caridade, amor, porque a verdadeira fidelidade não se manifesta com exceções ou preferências. Aquele que caminha para se aperfeiçoar em tudo, obedece à sentença de Jesus: “Sede perfeitos como perfeito é o vosso Pai Celestial.” Pelo que se conclui: expondo a parábola, Jesus teve por fim exortar seus discípulos a se aplicarem nessa virtude, que se chama fidelidade, para que pudessem um dia representá-la condignamente, tal como se manifesta nos Céus. Como tudo na Natureza e como tudo o que se faz mister para a perfeição, quer no plano físico ou na esfera intelectual e moral, a fidelidade vai-se engrandecendo em nós à proporção que nela nos aperfeiçoamos. Não a adquirimos de uma só vez em sua plenitude, mas paulatinamente, gradativamente. E aquele que já a possui em certo grau, como o “administrador infiel” da parábola, faz jus à benevolência divina. Pelo estudo analítico da Parábola vemos que o administrador foi acusado por alguém, ou por outra, foi denunciado como esbanjador dos bens de seu patrão, pelo que este resolveu chamá-lo à ordem, perguntando-lhe: “O que quer dizer esta denúncia que tive de ti? Dá conta 118 da tua administração; pois dessa forma não podes mais ser meu empregado.” Pela prestação de contas verificou-se não ter havido esbanjamento, mas sim facilidade em negócios, que prejudicaram o patrão. O prejuízo constava de vendas feitas sem dinheiro e sem documentos: cem cados de azeite e cem coros de trigo. Tanto assim que, legalizadas as contas, com as letras correspondentes ao valor de cinqüenta cados de azeite e oitenta coros de trigo”, “o amo louvou o administrador iníquo, por haver procedido sabiamente. E salientando a seus discípulos a boa tática comercial do empregado que não só garantia a empresa que lhe fora confiada, mas também constituía um bom meio de granjear amigos, disselhes: “Granjeai amigos com as riquezas da iniqüidade, para que, quando estas vos faltarem, vos recebam eles nos tabernáculos eternos.” É o mesmo que dizer: auxiliai, com as vossas sobras, os que têm necessidade e sede também indulgentes para com os pecadores, não lhes imputando o mal que fazem; mas antes, ao que deve cem cados de mal, mandai-o escrever só cinqüenta, e, ao que deve cem coros de erros, mandai-os escrever oitenta; mas observai-os, que precisam trabalhar para resgatar essa dívida. Fazei como fez o administrador infiel, assim chamado pelos seus acusadores, mas que, na verdade, procedeu sabiamente, “porque quem é fiel no pouco, também é fiel no muito; e quem é injusto no pouco, também é injusto no muito.” “Se não tostes fiéis nas riquezas injustas, quem vos confiará as verdadeiras? E se não fostes fiéis no alheio quem vos dará o que é VOSSO?” As riquezas da iniqüidade são os bens materiais, dos quais não somos mais que depositários; são riquezas injustas e não são NOSSAS, porque não prevalecem para a OUTRA VIDA. O que é NOSSO são os bens incorruptíveis, dos quais Jesus falou também a seus discípulos, para que os buscassem de preferência, porque 119 “os vermes não os estragam, a ferrugem não as consome, os ladrões não os alcançam nem a morte os subtrai.” Os discípulos, — como têm obrigação de fazer todos os que querem ser discípulos de Jesus — deveriam servir somente a Deus, que é o AMO, não se escravizando a qualquer inconsciente endinheirado ou pseudo-sábio que lhe queira dominar a consciência: não se pode servir a Deus e a Mamon! Conclui-se de tudo o que acabamos de ler que o título de infiel, dado ao administrador, foi mal aplicado, torcendo por completo o sentido que Jesus deu à mesma parábola. A palavra divina, pelo ser falha quando de humana interpretação, fazse mister recorrermos às Entidades Superiores do Espaço, para que lhe compreendamos sempre o sentido em espírito e verdade.

 120 PARÁBOLA DO RICO E LÁZARO “Havia um homem rico, que se vestia de púrpura e de linho finíssimo, e que todos os dias se regalava esplendidamente. Havia também certo mendigo, chamado Lázaro, coberto de chagas, que estava deitado ao seu portão, desejoso de fartar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico, mas ninguém lhas dava; e os cães vinham lamber-lhe as úlceras. “Morreu o mendigo, e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; morreu também o rico, e foi sepultado. “No Hades, estando em tormento, levantou os olhos e viu ao longe Abraão e a Lázaro no seu seio. “E clamou: Pai Abraão, tem compaixão de mim! E manda a Lázaro que molhe a ponta do seu dedo, e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama! “Mas Abraão respondeu: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens na tua vida e Lázaro do mesmo modo os males; agora, porém, ele está consolado, e tu em tormentos. Demais, entre nós e vós está firmado um grande abismo, de modo que os que querem passar daqui para vós não podem, nem os de lá passar para nós. “Ele replicou: Pai, eu te rogo, então, que os mandes à casa de meu pai (pois tenho cinco irmãos) para os avisar a fim de não suceder virem eles também para este lugar de tormento! Mas Abraão disse: Eles têm Moisés e os profetas; ouçam-nos. Respondeu ele: Não, Pai Abraão, mas se alguém for ter com eles dentre os mortos, hão de se arrepender. Replicou-lhe Abraão: se não ouvem a Moisés e aos profetas tampouco se deixarão persuadir, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos.” (Lucas, Cap. XVI, v. 19-31.) 121 Este ensino é a proclamação da Lei da Caridade, cuja execução é imprescindível para todos os que se abrigam sob o seu pálio santo, como também para os que fogem aos seus generosos convites. O Rico e o pobre Lázaro personificam a Humanidade, sempre rebelde aos ditames da Luz e da Verdade. O Rico gozou no mundo e sofreu no Espaço; o Lázaro sofreu no mundo e gozou no Espaço. Este Rico que se vestia de púrpura e que todos os dias se regalava esplendidamente, é o símbolo daqueles que querem tratar da vida do corpo e esquecem-se da vida da alma. São os que buscam a felicidade no comer, no beber e no vestir; são os que se entregam a todos os gozos da matéria, são os egoístas que vivem unicamente para si, os orgulhosos que, entronados nos altares das paixões vis, da vaidade, da soberba, não vêem senão o que lhes pode saciar a sede de prazeres, não cultivam senão a luxúria, que mata os sentimentos afetivos e anula os dotes de coração. O rico é a personificação daqueles que são escravos do reino do mundo, que não vêem mais do que o mundo, esse “paraíso perdido” entre os charcos da degradação moral, que avilta as almas e as atira aos infernos hiantes dos vícios. Jesus falava geralmente por parábolas; e esta lição que o Mestre ofereceu há 2.000 anos aos povos da Palestina, e que consta do Evangelho de Lucas como um conselho salutar e memorável, nada mais é do que uma parábola; é um ensino alegórico, representativo do que se passa no Espaço, para afirmar que a nossa Vida Ultra-Tumba, é uma conseqüência justa e eqüitativa da nossa existência na Terra. O rico passou toda a sua vida a se fartar esplendidamente, a desprezar os pobres, a desprezar Deus, a não curar da sua Lei, a dar as costas à Religião, a gozar e a folgar, mas, quando morreu, não pode continuar a viver como vivia, vestindo-se de púrpura, comendo manjares, bebendo licores, porque no mundo dos Espíritos não há púrpuras, não há manjares, 122 não há licores. Ele já se havia fartado com os prazeres da Terra, não podia fartar-se depois com os prazeres do Céu, porque não os havia buscado, nem havia adquirido o tesouro com que se conquista as glórias celestes. Nu, sem dinheiro, sem crédito para arranjar melhor “morada”, lhe foi destinado o Hades, e, segundo diz o texto, ele lá se achava, contrariado, por lhe faltarem as comodidades que tivera na Terra, os gozos de que fizera o seu reino no mundo. *** Lázaro representa os excluídos da sociedade terrena, aqueles que, quando muito, podem chegar ao portão dos grandes templos, aqueles que não podem atravessar os umbrais dos palácios dourados, aqueles que essa sociedade corrompida do mundo despreza, amaldiçoa, cobre de labéus, crava de setas venenosas que lhes chagam o corpo todo. Os Lázaros não são esses pobres orgulhosos do mundo, que não têm muitas vezes o que comer e o que vestir, mas estão cobertos com a púrpura do orgulho; não é essa gente que não tem dinheiro mas tem vaidade; não tem palácios, mas tem egoísmo; não tem jantares opíparos, mas tem prazeres nefastos; não, os pobres, de que Lázaro serviu de símbolo na parábola, são os que sofrem com resignação, são os que desprezam os bens da Terra, porque buscam as coisas de Deus; são aqueles que se vêem usurpados daquilo que por direito lhes pertence no mundo, mas, pacientes e resignados, não se revoltam, porque crêem no futuro e esperam as dádivas que lhes estão reservadas por Deus. Eles sabem, porque estudam, esperam e oram, que existe um Criador, um Pai Supremo, que lhes dará o prêmio de suas vigílias, um salário pelos seus afazeres morais, uma luz para sua orientação espiritual; e que esse prêmio, esse salário, essa luz, embora, às vezes, pareça tardar, não faltará, porque a Justiça de Deus é infalível, é indefectível! É assim que morreu 123 Lázaro, o mendigo, e foi conduzido pelos anjos ao Seio de Abraão; morreu também o rico e foi posto no Hades. Duas personalidades distintas uma que gozou, outra que sofreu: uma a quem nada faltava, outra a quem tudo faltava, vão trocar agora as suas condições; vão mudar de cenário: o mendigo vai para a abundância, e o rico é que passa a mendigar! É o reverso da medalha, que se apresenta a todos no dia do julgamento. Vós tendes visto muitas medalhas? Figuremo-las numa libra esterlina: de um lado traz a figura do rei, mas, do outro, traz o seu valor real. Assim acontece também conosco. Cada um de nós é uma medalha; e como a medalha, a libra de ouro vale segundo o câmbio corrente, assim também nós valemos de acordo com o câmbio espiritual, que taxa o valor das nossas almas. Aqueles que olham só a efígie, não conhecem o valor do dinheiro, porque a efígie, o verso da medalha, traz só o retrato do rei, e a medalha não vale o rei. Assim também os que olham o homem só pelas aparências, pelo exterior, não conhecem o homem, porque o exterior do homem é a efígie da vaidade, do egoísmo e do orgulho. O que vale na medalha é o reverso; o que vale no homem é o interior, ou seja, o Espírito. O rico trazia no verso o característico do rei, mas, depois que morreu, apurou-se o valor da medalha gravado no reverso, e esse valor não permitiu ao rico senão uma “entrada” no Hades. Ao pobre, que apurara, desde a sua existência na Terra, o que estava gravado no reverso da medalha, esse sacrifício lhe deu o valor de ser levado pelos anjos ao Seio de Abraão. Como é diferente o julgamento de Deus, do julgamento dos homens! Deus não se deixa levar pelo preconceito; Deus não se deixa levar pelo juízo humano. Que é o seio de Abraão? Mas continuemos a nossa análise. 124 Que é o Hades? Que é Hades? É isto que precisamos saber para melhor compreendermos a parábola do Grande Mestre. *** Seio de Abraão é a liberdade do Espírito no Espaço Infinito; Seio de Abraão é o Mundo Invisível, onde os Espíritos, com os seus corpos imponderáveis, caminham livres de todas as peias, realizando sempre novas conquistas, fazendo novas descobertas, aprendendo novas verdades que os elevam em conhecimentos, que os elevam em felicidade. Seio de Abraão é o Mundo da Imortalidade, da Luz e da Verdade, onde quanto mais progredimos mais aprendemos, e quanto mais aprendemos mais sabemos amar nosso Deus e nosso próximo; é o mundo da Fé verdadeira, que abala e transporta montanhas, faz espumar oceanos e produz ventos; mas que também dá calma e bonança a todos aqueles que, como os discípulos no Mar da Galiléia, batidos pelo rijo tufão, imploram o auxílio de Jesus, e, com a esperança de salvamento, ouvem as doces palavras do Humilde de Nazaré soarem a seus ouvidos como uma luz a iluminar o caminho numa noite tenebrosa. Abraão foi o Patriarca dos Hebreus, alta personagem do Antigo Testamento, em quem a fé mais se acrisolava, mais viva e rútila se mostrava, a ponto de não vacilar em sacrificar seu filho Isaac, para obedecer às ordens que havia recebido do Alto. Abraão era um crente sincero na Imortalidade: via o Espaço semeado de Espíritos, conversava com os Espíritos daqueles que nós chamamos, indevidamente, mortos, vivia em relações contínuas com o Mundo dos Espíritos, que era o seu Seio predileto, que era o seu Paraíso, o seu Céu, a sua delícia, a sua felicidade. Para ai é que foi Lázaro, com inteira liberdade de locomoção nos ares. Ele havia sofrido na Terra, aguilhoado pela dor, na miséria, privado das 125 delícias do mundo, mas cria num Deus Supremo, que lhe concedera aquela existência de expiação e de provas, para que reparasse os males de suas vidas passadas, em que havia também descurado das coisas divinas e só tratado dos gozos efêmeros do mundo; Lázaro saldara a sua conta; ao sair da prisão corpórea, tinha pago o último ceitil de sua dívida, e reconquistara o Reino da Liberdade e da Luz, que Deus concede a todos os que se submetem à sua Lei, aos seus santos desígnios. Eis o que é o Seio de Abraão; eis o painel, o quadro majestoso que Jesus desenhou aos olhos dos ouvintes da parábola com referência a Lázaro, ao mendigo, que tinha como única caridade, na Terra, as carícias, os beijos dos cães, esses fiéis amigos dos homens, que vinham lamber-lhe as chagas! *** Continuemos a respigar o Evangelho, e do Seio de Abraão passemos ao Hades. — Que pensais vós que seja o Hades? Os antigos acreditavam na existência de um mundo subterrâneo, para o qual iam as almas daqueles que não foram bons na Terra. O corpo ficava no sepulcro, e o Espírito ia para o Hades: “mundo localizado nas entranhas da Terra. (*) Daí, essas almas não poderiam sair, assim como nós, em corpo de carne, não podemos sair deste mundo. Entretanto, os Espíritos que estavam no Hades viam com os olhos da alma, e sabiam, portanto, tudo o que se passava no Seio de Abraão. E era justamente nisso que consistia o sofrimento deles: verem o que se passava no Alto, e não poderem participar dessas regalias que só eram concedidas àqueles que, como Lázaro, haviam saldado sua conta espiritual. Por isso diz o Evangelho que o rico levantou os olhos e viu ao longe Abraão e Lázaro no seu Seio, e clamou: Pai Abraão, tem compaixão de 126 mim! E manda a Lázaro que molhe a ponta dó seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama!” O rico queria água! Antigamente passara a vinhos e licores finos, mas no Hades pedia água; tinha sede e essa sede não era a do corpo, não se tratava de água de rios ou de fontes, porque o corpo estava no sepulcro, e o Espírito não pode beber água material. Era sede de consolação, de esperança, de perdão! Ele também já havia compreendido que a causa das suas dores era a vida dissoluta que passara no mundo e a chama viva do remorso abrasava a sua consciência! Ele queria água, essa água da vida, essa água de salvação que Jesus havia dado à Mulher de Samaria. Essa água do perdão dos pecados que o rico havia cometido contra todos os que mendigam dos homens a caridade da atenção para as coisas divinas. E Abraão; o grande Patriarca, que vivia feliz no Mundo Espiritual, dirigindo a enorme falange de Espíritos que havia aumentado a sua descendência, falange de Espíritos a quem guiava, e entre os quais se contava Lázaro, que era um dos seus protegidos espirituais, Abraão respondeu ao rico: “Filho, lembra-te que recebeste os teus bens na tua vida; e Lázaro do mesmo modo os males. É justo, pois, que ele, agora, esteja consolado, e tu em tormentos. “Acresce ainda que entre nós e vós está firmado um grande abismo, de modo que nem nós podemos viver onde vós estais, nem vós podeis viver onde nós estamos; a vossa atmosfera nos abafa, assim como a vossa vos sufocaria; os ares que respiramos são insuficientes para vós que estais impregnados de matéria. “Tratastes só da matéria, só do corpo; cultivastes a matéria que não vos deixa elevar e chegar até nós. Ao passo que Lázaro teve os olhos voltados para o Alto, não tendo tempo senão de pagar dívidas materiais, e 127 conquistou fluidos espirituais para se elevar ao lugar em que se acha atualmente.” Mas Abraão ouvia a voz do rico, e o rico ouvia a voz de Abraão; o rico no Hades via Lázaro no Seio de Abraão, todos eles se comunicavam, falavam, conversavam; porque havia necessidade de o rico ser exortado para se regenerar mais tarde, e, como Lázaro, vir novamente ao mundo pagar a sua dívida, para, como Lázaro, depois subir também ao Seio de Abraão; porque também ele era filho de Abraão, e Abraão não deixaria seu filho perecer! Abraão chamou-o de filho; disse-lhe: “Filho, lembra-te da tua vida e lembra-te da vida de Lázaro”, querendo dizer com isto que, sem voltar à vida corporal, semelhante à de Lázaro, para sofrer as conseqüências do seu orgulho e do seu egoísmo, ele, o rico, não chegar ao seu Seio! Foi então que o Espírito do rico, agora cheio de pobreza e de sofrimento, lembrando-se de seus cinco irmãos, que faziam a mesma vida que ele fazia quando estava na Terra, replicou: “Pai, eu te rogo, então, que o mandes à casa de meu pai (pois tenho cinco irmãos) para os avisar, a fim de não suceder virem também eles para este lugar de tormentos.” O rico, que estava no Hades, sabia muito bem, porque via que Pai Abraão mandava sempre outros Espíritos dar avisos aos homens da Terra; então pediu que o mandasse à casa daquele que havia sido seu pai, porque ele tinha cinco irmãos que também faziam vida dissoluta e precisavam ficar conhecendo os tormentos que os aguardavam se continuassem assim. Mas Abraão lhe disse: “Eles têm Moisés e os profetas, ouçam-nos.” O que significa: “Moisés conta-lhes tudo o que precisam fazer para serem felizes, e os profetas, que são médiuns, dizem-lhes, pela influência dos Espíritos, o que se passa depois da morte, a fim de lhes dar instruções para que não venham, como tu, parar no Hades.” Mas o rico insistiu com Abraão, e, apresentando-lhe várias razões, disse: “Mas, Pai Abraão, se algum dos mortos for ter com eles, e lhes falar, lhes aparecer, e eles se manifestar, hão de se arrepender.” 128 O rico desejava que seus irmãos tivessem uma manifestação positiva dos mortos, porque julgava que, por essa forma, se tornariam obedientes à Lei de Deus. Mas Abraão respondeu novamente: “Se eles não ouvem a Moisés e aos profetas, tampouco se deixarão persuadir, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos.” Pois se eles haviam repelido as exortações dos profetas, por quem os mortos costumavam falar, como haveriam de crer nos mortos. Para crer nos mortos era necessário crer nos profetas, porque os profetas não eram mais do que médiuns, por quem se comunicavam os Espíritos dos mortos. Se eles não acreditavam nos médiuns, como haveriam de crer nos Espíritos. Como poderiam os Espíritos dos mortos avisá-las como o irmão queria, sem os médiuns indispensáveis para transmitir a comunicação. Sabemos que o corpo do Espírito é muito mais rarefeito do que o nosso e que por isso não o podemos ver nem ouvir; e que o Espírito sempre se manifesta com o concurso de um médium; como poderia Abraão atender o pedido de seu filho para satisfazer outros cinco filhos ricos?. *** Finalmente, antes que Jesus houvesse proposto à multidão, que se achava em torno dele, a bela parábola que acabamos de estudar, havia ele dito aos fariseus, que eram avarentos: “A Lei de Moisés e os profetas duraram até João Batista; desde esse tempo o Evangelho do Reino de Deus é anunciado; e todos à força entram nele; porém da Lei de Deus não cairá um til, não será suprimido um i.” Deus dá a liberdade a todos para buscarem a sua Lei; e àqueles que buscam, o Pai não dá o Espírito por medida. Está escrito “Aquele que pede, recebe: o que busca, encontra; e ao que bate, se abre, porque o Pai 129 não dá uma pedra a quem lhe pede um pão, nem uma serpente a quem lhe pedir um peixe.” (Mateus, 7-8). Assim Deus respeita o livre arbítrio que a cada um concedeu. Os Espíritos dos mortos podem comunicar-se e se manifestam aos vivos, mas não podem obrigar os vivos, embora sejam eles ricos e grandes, a tomarem, desde já, posse da felicidade futura! E é por isso que sabemos de muitos ricos das coisas do mundo, e muitos pobres que querem enriquecer com as coisas do mundo, que, embora tenham visto e ouvido manifestações e avisos dos mortos, não se convenceram com esses avisos. Ao contrário, dizem que foi ilusão, medo, tolice e loucura! Por isso fez bem Abraão em não permitir a manifestação espírita aos cinco irmãos ricos daquele que se vestira de púrpura e se banqueteara esplendidamente todos os dias da sua existência na Terra. *** O homem que se quer convencer pela força, há de lhe acontecer o que aconteceu à cigarra de La Fontaine: “Cantou a sua vida, mas depois chorou a sua morte.” E há de voltar chorando na outra vida para, com justa razão, cantar na Imortalidade.

130 PARÁBOLA DO SERVO TRABALHADOR
 “E disseram os Apóstolos ao Senhor: Aumenta-nos a fé. E o Senhor respondeu: Se tivésseis fé do tamanho de um grão de mostarda, diríeis a este sicômoro: Arranca-te e transplanta-te no mar; e ele vos obedeceria. “Qual de vós, tendo um servo ocupado na lavoura ou guardando gado, lhe dirá, quando ele voltar do campo: Vem já sentar-te à mesa? Antes lhe dirá: Prepara-me a ceia, cinge-te e serve-me, enquanto eu como e bebo; e depois comerás tu e beberás? Porventura agradecerá ao servo, por ter este feito o que lhe havia ordenado? Assim também vós, depois de haverdes feito tudo o que vos foi ordenado; dizei: Somos servos inúteis, fizemos o que deviam os fazer.” (Lucas, XVII, 7-10.) Era costume, antigamente, utilizar-se dos servos que trabalhavam na lavoura ou guardavam gado: ao chegarem, à tarde, preparavam a ceia para o seu amo, serviam a mesa, e, depois, ceiavam. Aquele que assim não fizesse deixaria de cumprir o seu dever, e o que assim procedia, não fazia mais que cumprir sua obrigação, porque para tal mister fora contratado e recebia seu salário. Não se jactava de assim proceder, visto o prévio ajuste que houvera entre ele e o patrão. Jesus, que se aproveitava sempre do que ocorria cotidianamente, para dar boas lições àqueles que deviam ser, mais tarde, os seus apóstolos, ao pedirem estes ao Senhor que lhes aumentasse a fé, depois de exaltar as virtudes da fé e o poder que a mesma mantém, lhes propôs a chamada Parábola do Servo Trabalhador. Quis o Mestre fazer ver a seus discípulos que a fé é o salário dos bons obreiros, e para que esse salário seja aumentado, é preciso que os obreiros cumpram primeiramente seus deveres, mas sem jactância, com humildade, 131 como quem se considera pago com as graças recebidas para desempenhar a sua tarefa. (*) A lavoura é o símbolo da Religião, que deve ser cultivada por todos; o gado constitui ou representa “esses todos”, ou seja, os que se querem instruir na Religião, os guardadores de gado; o dono da lavoura ou do gado é Jesus que nos veio trazer esse alimento de Vida Eterna. A fé, como já dissemos, não é uma coisa abstrata, como não é abstrata a semente de mostarda. Assim como esta é alguma coisa substancial, também a fé contém tão poderosos elementos que os que a possuem chegam a operar maravilhas, como “arrancar sicômoros e arrojá-las ao mar”! A semente de mostarda, quando chocha, é estéril, não dá espigas, não serve para condimento, não se presta como medicamento, enfim não tem valor algum. A fé que se acha nestas condições também não tem valor algum. E o que diremos da fé que nem mesmo aparenta a semente chocha da mostarda? Acresce outra circunstância que observamos na parábola: os apóstolos não acreditavam nessa fé que se recebe de um jacto, como a prescrevem as Igrejas; achavam que ela é suscetível de aumento, tanto que pediram a Jesus: “Senhor, aumenta-nos a fé.” E o Senhor não os dissuadiu dessa crença, antes alimentou-lhes a esperança, estimulando-os ao trabalho e à perseverança, ao cumprimento do dever, que é o meio pelo qual alcançariam tal desiderato. O Espiritismo, que é o Consolado r prometido por Jesus para relembrar aos homens tudo o que Ele disse, explica, em espírito e verdade, a sua palavra e traz, a todos, o complemento dos Ensinos Cristãos, que não podiam ser dados naquela época devido ao atraso intelectual de então. O Espiritismo vem cumprir a sua missão, oferecendo aos homens a explicação sucinta da Religião em suas modalidades científica e filosófica.

 132 PARÁBOLA DO JUIZ INÍQUO
 “Propôs-lhes Jesus uma parábola para mostrar que deviam orar sempre e nunca desanimar, dizendo: Havia em certa cidade um juiz, que não temia a Deus, nem respeitava os homens. Havia também naquela mesma cidade uma viúva que vinha constantemente ter com ele, dizendo: Defende-me do meu adversário. Ele por algum tempo não a queria atender; mas depois disse consigo: se bem que eu não tema: a Deus, nem respeite os homens, todavia como esta viúva me incomoda, julgarei a sua causa, para que ela não continue a molestar-me com as suas visitas. Ouvi, acrescentou o Senhor, o que disse este juiz injusto; e não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que a Ele clamam dia e noite, embora seja demorado a defendê-los? Digo-vos que bem depressa lhes fará justiça. Contudo, quando vier o Filho do Homem, achará, porventura, fé na Terra?” (Lucas, XVIII, 1-8.) A iniqüidade é a falta de eqüidade, é a justiça revoltante. O iníquo é o homem perverso, criminoso, seja ele juiz, doutor, nobre, rico, pobre, rei. Na esfera moral, mesmo aqui na Terra, não se distinguem os homens pelo dinheiro e pelos títulos que possuem, mas, sim, pelo seu caráter. O iníquo não tem caráter, ou, por outra, tem caráter iníquo, pervertido. Mas ainda esse, quando tem de resolver alguma questão e o solicitante resolve bater à sua porta até que dê provimento ao seu pedido, para não ser incomodado, e porque é iníquo, resolve, com presteza, o problema, não para servir, mas para ficar livre de continuar molestado. Foi o que sucedeu com o juiz iníquo ante a insistência da viúva. De modo que a demora do despacho na petição da viúva foi causada pela iniqüidade do juiz. Se este, fosse eqüitativo, justo, reto, de bom caráter, cumpridor de seus deveres, a viúva teria recebido deferimento do seu pedido com muito maior antecedência. 133 Seja como for, o despacho foi dado, embora a custo, após reiteradas solicitações, importunações cotidianas, e o juiz, apesar de iníquo, para não ser “amolado”, resolveu a questão. “Ora, disse Jesus, ouvi o que disse esse juiz iníquo; e não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que a Ele clamam noite e dia, embora seja demorado em defendê-los? Digo-vos que bem depressa lhes fará justiça.” Se a justiça, embora demorada, se faz na Terra até contra a vontade dos juizes, como não há de ser ela feita pelo Supremo e Justo Juiz do Céu? A deficiência não é, pois, de Deus, mas sim dos homens, mormente na época que atravessamos, em que o Filho do Homem bate a todas as portas, inquire todos os corações e os encontra vazios de fé, vazios de crença, vazios de amor a Deus, vazios de caridade! Antigamente havia juizes iníquos; hoje, pode-se dizer que nem só os juizes, mas até os peticionários são iníquos! A iniqüidade lavra como um incêndio devorador, aniquilando as consciências e maculando os corações: homens iníquos, lares iníquos, sociedades iníquas, governos iníquos, leigos iníquos, sábios iníquos; tudo isso devido à crença sacerdotal, aos dogmas das seitas dominantes! Mas o Senhor aí está a destruir a iniqüidade, e, com ela, os iníquos. 134 

PARÁBOLA DO FARISEU E DO PUBLICANO
 “Propôs também a seguinte parábola a alguns que confiavam na sua própria justiça e desprezavam aos outros: Subiram dois homens ao templo para orar: um fariseu e outro publicano. O fariseu, posto em pé, orava dentro de si desta forma: Ó Deus, graças te dou, que não sou como os demais homens, que são ladrões, injustos, adúlteros — nem ainda como este publicano; jejuo duas vezes por semana, e dou o dízimo de tudo quanto ganho. O publicano, porém, estando a alguma distância, não ousava nem ainda levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: “Ó Deus, sê propício a mim, pecador! Digo-vos que este desceu justificado para sua casa, e não aquele; porque todo o que se exalta, será humilhado; mas o que se humilha, será exaltado.” (Lucas, XVIII, 9-14.) A seita farisaica era a mais prestigiada no tempo de Jesus, a mais influente, a mais dominadora, a que mais se salientava. Era uma espécie de Catolicismo Romano. Os fariseus, entretanto, eram servis observadores das práticas exteriores, do culto e das cerimônias. A religião, para eles, era uma aparência de virtudes: preferiam sempre a letra da lei, que mata, ao espírito que vivifica! Eram hipócritas, inimigos encarniçados das inovações, cheios de orgulho e de excessivo amor ao domínio. Eles tinham uma aversão especial aos publicanos, a quem consideravam gananciosos, e também porque, inimigos do fisco, tinham de pagar a estes os impostos que lhes cabia na coleta. De maneira que os publicanos eram, para os fariseus, homens desprezíveis da baixa sociedade, e, portanto, cheios de mazelas, “ladrões, injustos, adúlteros”, não só porque não se curvavam muitas vezes às práticas dos sacerdotes fariseus, como, também, porque uma prevenção 135 partida ria anterior os havia separado da seita farisaica, ou do Judaísmo. Jesus, que muito se ocupou em desmascarar a hipocrisia dos fariseus, julgou acertado propor esta parábola, cujas principais figuras eram: um fariseu e um publicano. Quis o Mestre mostrar que o orgulho de seita, o orgulho de classe, o orgulho de família, o orgulho pessoal — finalmente, o orgulho em suas múltiplas formas, é mais prejudicial à salvação do que mesmo “o publicanismo”, como o concebiam os fariseus! Ainda mais: quis demonstrar que no publicano, com todos os seus senões, ainda se encontrava um gesto de humildade, o que não acontecia no fariseu. O publicano conhece os seus defeitos, sabe que é pecador; nem ousa levantar os olhos para o céu; limita-se a bater no peito e a dizer: “O Deus, sê propício a mim pecador!” Enquanto o fariseu reconhece em si somente qualidades boas, e a sua prece é uma acusação aos outros, até ao pobre publicano que lá estava rogando ao Senhor o perdão de suas faltas! O orgulho é um dragão devorador, que destrói todas as qualidades do Espírito; enquanto a humildade, ao olhar de Deus, nos eleva à dignidade dos justos! Vale mais ser publicano e miserável, do que fariseu coberto de ouro e de pedras preciosas.